segunda-feira, 15 de janeiro de 2018

O “gato” que não era nosso

* Por Francisco Simões

A história que lhes vou contar agora é verdadeira, aconteceu conosco e serve de alerta para quem comprar uma casa. No segundo semestre de 2004, Marlene, após muita procura e desencantos, encontrou esta casa e por ela logo se enamorou. Já estávamos desistindo de procurar quando o corretor, nosso amigo, insistiu para vermos ao menos mais esta. Ele acertou no alvo.

Quando estávamos no Cartório acertando detalhes da compra para então ser preparada a escritura, o ex-proprietário, demonstrando ser um sujeito meio “folgado”, jogou algumas piadinhas para cima de mim. Eu estava presente porque dava força à amiga de tantos anos que enfim iria ter um lar muito maior, dar conforto a sua família e uma propriedade digna, toda sua, em seu nome.

Sabendo que eu trabalhara no Banco do Brasil o vendedor começou com gracinhas perguntando se eu não podia pagar as despesas que cabiam a ele, e não à Marlene. Não respondi para não ser malcriado, mas ele bem que merecia. Afinal já sabíamos que o trapaceiro deixara 15 contas de água e mais 15 contas de energia elétrica, mais de um ano de contas não pagas por ele.

Claro que a amiga concordou em pagar as contas muito atrasadas para pôr tudo em ordem e logo que fosse possível se mudar para o novo lar. O sujeito era empresário em outro Estado e tinha boa situação, mas tão mesquinho que ao nos entregar as chaves retirara todas, repito, todas as lâmpadas da casa e as levou com ele. Pensávamos que as tramoias dele parariam ali, porém estávamos enganados.

Marlene e sua família se mudaram quase no final de 2004 para esta nova casa aonde, por ironia do destino, eu viria também habitar a partir do final de janeiro de 2007. Ocorreu que eu tive um problema sério de saúde. O cardiologista, que passou a ser um dos médicos da minha vida, proibiu-me de continuar a morar sozinho com meu cachorrinho Touche na minha casa no bairro do Braga. Foi a minha sorte e do meu Touche que aqui se reencontrou com a amiga Tuane.

Isto foi só um introito do drama que viria depois. Agora em 2012, justo quando a Prefeitura fazia uma grande obra por toda a nossa rua durante mais de um mês, a empresa de águas da região, atualmente a PROLAGOS, veio trocar todos os hidrômetros antigos que ainda haviam sido instalados pela incompetente CEDAE. Esta providência eles estavam levando a toda a cidade de Cabo Frio.

Veio uma equipe de nove homens. Tocaram nossa campainha e os fui atender. Explicaram-me que iam ter que quebrar a calçada para trocar o cano antigo por um novo, mais resistente, que liga o hidrômetro à rede de água. Entrei e eles começaram a trabalhar. Alguns minutos depois novamente me chamaram. O Chefe da equipe mostrou-me o que haviam encontrado no buraco da calçada que tinham acabado de abrir.

Olhei e vi que o cano antigo, pouco antes de chegar ao hidrômetro, apresentava uma emenda lateral que, após cerca de um metro, entrava por baixo de nosso muro. Aquilo caracterizava a existência do que chamam de “gato”. Algo irregular, desonesto e passível de punição. Importante: não fôramos nós que fizéramos aquilo, e jamais o faríamos. Mas, pergunto: como provar? O cano era velho do mesmo tipo do que vinha da rede antiga também.

Logo fui advertido pelo Chefe da equipe de que eles teriam que aplicar um auto de infração e nós seríamos punidos com uma multa pela PROLAGOS. Após muita conversa eu disse que então mandassem a multa na próxima conta, já que eu só tinha, em minha defesa, a minha palavra de honra de não sermos os autores daquela irregularidade, mas palavra de honra neste país anda mais suja que lixo.

Entretanto uns 17 dias depois chegou uma comunicação exibindo multa em torno de 500 reais mais outra cobrança de quase 500 reais referente a um “eventual prejuízo causado à Companhia pelo uso do “gato”. No mesmo documento estava escrito que demonstramos desprezo pelo prazo de 15 dias para apresentar recurso à PROLAGOS. Ocorre que ninguém nos informara disso antes.

Por outro lado, nós iríamos recorrer do quê? Iríamos tentar provar o quê? A evidência estava lá, havia 10 testemunhas da Empresa contra minha palavra de honra que não resistiu nem um round. Mesmo assim tratei de começar a recorrer à Ouvidoria da PROLAGOS onde fui muito bem acolhido em minhas intenções pela Ouvidora com quem mantive diversos contatos amistosos e responsáveis.

Argumentei com ela tanto por escrito como ao telefone em várias ligações. Ela procurou examinar minuciosamente todo o caso desde o começo e me prometeu apresentar uma solução, fosse ela qual fosse, em no máximo 15 dias. Na minha visão dificilmente ela poderia me dar razão até porque seria abrir uma exceção perigosa mesmo sabendo que eu estivesse certo no que afirmava.

A certa altura da troca de mensagens entre nós e a Ouvidora ela escreveu o que me permito reproduzir aqui tal e qual ela nos mandou: "É muito importante, que antes de comprarmos um imóvel, nos certifiquemos que o mesmo encontra-se regular, sem qualquer pendência junto às prestadoras de serviço, se não há qualquer irregularidade, para que não ocorra o que acabou acontecendo com vocês." (Grifo meu).

Entendi a intenção da ilustre Ouvidora, mas ao mesmo tempo tive que fazer ver a ela que no casso ocorrido não havia como se ser cauteloso, ou cuidadoso, pois quando se compra uma casa não se sai quebrando toda uma calçada para ver se há algo errado, e nem se cava todo um quintal para descobrir algum eventual cadáver ali deixado pelo vendedor. Isto é loucura. Argumento perfeitamente dispensável.

Vejam a conclusão final do exame feito com palavras que recebi por escrito e guardei, formando um processo que aqui está para sempre: “Desta forma, foi cobrado na conta de Ref. 04/2012 os seguintes valores:
- Multa no valor de R$ 464,65;
- Valor retroativo de R$ 524,40 referente ao mínimo de 12 meses pelo cadastro de 1 residência – conforme artigo 103 do Decreto Estadual 22.872/96.
TOTAL COBRADO PELA INFRAÇÃO: R$ 989,05 (novecentos e oitenta e nove reais e cinco centavos) (Grifo meu).

Mesmo tendo a Concessionária julgado à revelia a defesa apresentada, esta, através da Ouvidoria, analisou cuidadosamente cada informação prestada pelos senhores. Compreendemos a situação exposta, acreditamos que tal irregularidade não tenha sido executada por vocês, entretanto a responsabilidade do imóvel é da Sra. Marlene e quaisquer cobranças provenientes de irregularidades encontradas no imóvel ou em benefício deste, será devida à mesma.” (Grifo meu).

Em outras palavras, eles acreditaram que nós realmente não fizemos aquele “gato”, e não fizemos mesmo, todavia, por isto e mais aquilo eles tiveram que nos punir para, quem sabe, mesmo inocentes, servirmos de “exemplo” em casos futuros. Mesmo assim não culpo a Empresa, muito menos a Ouvidoria, pois nos entendemos bem e eu já esperava ser esta a única solução que eles poderiam dar a este caso. Como diria alguém: “Azar o nosso, pois”.

Encerrando, pagamos caro pelo “gato” que não era nosso. Cuidado quando você comprar uma casa, por favor.


* Jornalista, poeta e escritor.

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