segunda-feira, 8 de janeiro de 2018

Em torno de uma palavra incomum


O leitor, porventura, saberia dizer o significado da palava “oblívio”? Não, amigos, não me equivoquei na grafia e nem cometi erro de digitação. A palavra é essa mesmo. E não a inventei agora, como possa parecer aos desavisados. Sei que é antipático, e pior, que é pedante desafiar o conhecimento alheio, ainda mais publicamente. Juro, porém, que neste caso não se trata de nenhum desafio. Até porque, não faz muito eu também não tinha a mais remota ideia do que esta palavra significa. Não, pelo menos, até ser presenteado por um amigo com o excelente livro do não menos excelente poeta cearense Eduardo Pragmácio Filho, intitulado, justamente “Oblívio da ilusão”. A princípio pensei que o autor havia cometido erro de grafia, e justamente na capa, no título da sua obra e que a Editora Imprece – Impressora do Ceará, havia embarcado nesse erro.

Como tenho por hábito manter sempre o cuidado de verificar todas as possibilidades, antes de concluir que alguém errou alguma coisa, sobretudo quando se trata da nossa complexa (e rica) língua portuguesa, fiz o óbvio. Ou seja, recorri de imediato ao dicionário para verificar se a palavra existia mesmo. E lá estava ela, “oblívio”, gloriosamente, com seus vários significados. Trata-se de um substantivo masculino que significa “ação ou efeito de esquecer; perda de memória; esquecimento”. Tem, ainda, o sentido figurado: “condição do que, ou de quem se encontra em repouso, descanso ou adormecimento”.

A princípio pensei tratar-se de um termo arcaico, desses milhares em desuso. Nestes casos, porém, os dicionários costumam esclarecer tal condição. E, embora seja raríssima, não é o caso dessa palavra, oriunda de duas outras expressões latinas. Uma é a própria “oblívio”, que no elegante idioma de Virgílio, Horácio e Ovídio, era usada para expressar apenas “esquecimento”. A outra é “oblivisci”, ou seja, “esquecer-se”, mas também usada para expressar os verbos “emparelhar”, “suavizar” e “alisar”.

Comentando o caso com amigos, ou seja, se palavras, como esta, devem ou não ser utilizadas em textos (literários, claro, pois entendo que em uma reportagem jornalística a expressão não caberia de jeito algum), não chegamos a nenhuma conclusão. A bem da verdade, devo informar que fui voto vencido. A maioria dos amigos concluiu que o uso dessa palavra estranha e desconhecida não se justifica, pois se for utilizada, seu uso será interpretado pelos leitores como manifestação explícita de pedantismo. Eu penso de forma um tanto diferente. Entendo que, se a palavra existe, não há porque abrir mão de seu uso. Mas com uma ressalva: abrindo um parêntese no texto para explicar seu significado e sua origem. É, segundo entendo, uma forma de enriquecer o vocabulário do leitor, sem que o entendimento seja comprometido.

Uma das funções da Literatura, se não a mais importante, é trazer ao seu destinatário novos conhecimentos. Se você leu atentamente algum livro e não aprendeu nada com ele é porque... este é ruim. Isso se leu, de fato, com a devida atenção. Caso contrário… você que é ruim. É desatento, preguiçoso ou com profunda deficiência cultural. Todavia, fazer Literatura é exercer uma forma (a mais nobre) de comunicação. E esta requer, sobretudo, clareza, para ser eficaz. Posso (e até devo em algumas circunstâncias) utilizar expressões incomuns. Mas estarei sendo péssimo escritor (e comunicador) se simplesmente lançá-las ao leu, sem esclarecer o leitor sobre seus significados, sem que seja necessário que ele recorra a algum dicionário.

Agindo assim, eu estarei trazendo, simultaneamente, novos conhecimentos a quem se dispuser a ler o que escrevo e me fazer completamente entendido por ele, sem hiatos e nem ambiguidades. E não estou sendo incoerente em minha postura habitual. Sempre defendi que o melhor dos textos é aquele simples, mas sem nenhuma impropriedade vocabular e gramatical. Escrita eivada de erros pode ser tudo, menos Literatura. E sempre alertei que não se deve confundir “simplicidade” com “banalidade” ou com relaxamento, tanto de ideias quanto, e principalmente, da sua exposição. Ser simples não significa, de jeito algum, ser “simplório”, ora bolas.

Quando ao livro de Eduardo Pragmácio, “Oblívio da ilusão”, que suscitou estas descompromissadas reflexões, recomendo-o sem pestanejar a quem tenha a felicidade de adquiri-lo de alguma forma. Sua poesia é encantadora, marcante e empolgante. Pena que, salvo exceções, só atentemos para poetas do eixo Rio-São-Paulo-Belo Horizonte-Porto Alegre. A Literatura brasileira é, estejam certos, muito mais rica do que se possa supor.

Boa leitura!


O Editor.

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Um comentário:

  1. Rica em produção e pobre em vendas, é o que dizem os poetas, e completam: poesia não vende.

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