terça-feira, 2 de janeiro de 2018

É difícil...


A vida nos impõe uma série de obstáculos, de longo, médio, curto e curtíssimo prazo, que nos desafia a superar. Quem tem garra e consegue evitar a erosão da autoconfiança; quem persiste com a convicção dos vencedores, quem age com competência mesmo sem contar com apoio e motivação, é “possível” que vença e atinja seus objetivos. Certeza, certeza mesmo, não se tem nenhuma. Ou melhor, tem-se uma, que não é nada agradável. Quem não agir dentro do figurino citado, pode estar certo de que o fracasso vai ocorrer, sem recursos ou remissão.

É difícil, por exemplo, a quem lida com ideias – jornalistas, escritores, filósofos etc. – produzir, todos os dias, um texto original, útil, rigorosamente correto e coerente com determinada linha de pensamento e que, sobretudo, desperte o interesse geral, sem sofrer contestações ou sequer restrições de quem quer que seja. Este é o sonho do redator, que tem a obrigação de gerar, diariamente, uma coluna em jornais (por exemplo) ou mesmo em blogs ou sites na internet.

Quem consegue a aprovação, digamos, de 10% dos que leem o que escreveu, já pode se dar por satisfeito. Ainda quando as contestações e restrições são explicitadas, as coisas não são tão ruins. O pior é a omissão. É quando o texto que você produziu com tanto carinho e, não raro, com muito esforço, não repercute. Quando você não sabe se agradou ou não seu destinatário, o leitor. Quando tem que escrever no dia seguinte, mas sem contar com nenhum parâmetro ou referencial que lhe indique se deve continuar na mesma linha que vem seguindo ou se precisa alterá-la, às vezes radicalmente, para finalmente alcançar o objetivo maior de quem escreve: o de ser lido.

Como se vê, é difícil, muito difícil. Mas o elenco de dificuldades não se restringe a isso. Antes se restringisse. Passa por tantas outras situações diárias, algumas apenas aborrecidas, outras dramáticas e outras, até, extremas. É difícil manter o bom humor o tempo todo, por mais que você se sinta preparado para encarar as surpresas da vida, em meio a tantos problemas e aborrecimentos, que vão desde os pequenos atritos domésticos, às ações dos políticos, que se corrompem e dilapidam o erário público e, pior, agindo em seu nome, que votou neles. É difícil, muito difícil.

E o elenco de dificuldades se estende, mais e mais, bloqueando (quando não anulando ou pulverizando) suas pequenas alegrias e impedindo que você usufrua plenamente delas. Quer dificuldade maior do que conservar o otimismo face a tantas notícias ruins divulgadas pelos meios de comunicação? Eles, porém, frise-se, não são os culpados, claro. Apenas refletem uma realidade violenta e perversa. São meros espelhos, que mostram, de corpo inteiro, uma sociedade podre e egoísta.

Como manter a serenidade, caríssimo leitor, diante do massacre de crianças, ocorrido em uma escola pública de Realengo, no Rio de Janeiro há sete anos? Não dá! Por mais insensível que se seja, fatos como este são como socos no estômago. Tiram-nos o fôlego. Quem é pai sabe o drama dos que perderam filhos, de maneira estúpida e cruel, diante de um surto psicótico de um maluco qualquer. O pior é que episódios como este, com o mesmo grau de dramaticidade e horror, se repetem, repetem e repetem em várias partes do mundo. Como não se sensibilizar com esse tipo de chacina, que a qualquer momento, sem nenhum aviso, pode nos afetar diretamente?! É difícil, muito difícil.

O rol de dificuldades diárias, todavia, ainda está muito longe de se esgotar. Claro que minha pretensão não é a de esgotá-los, mas de citar, mesmo que de passagem, uma ou outra, a título de exemplo. Os mais antigos acusam, amiúde, esta geração de ser sumamente individualista e de adorar o próprio umbigo. Até pode ser. Mas é difícil, muito difícil não abrirmos mão dos ideais que nos empolgaram na juventude, de solidariedade, justiça social e paz.

Malhar em ferro frio é inútil e, sobretudo, cansativo. Como manter intactos os ideais face às incertezas do cotidiano, decorrentes de decisões cínicas e oportunistas dos poderosos, que num piscar de olhos decidem bombardear, sem mais e nem menos, populações indefesas a pretexto de lhes “levarem a liberdade”? Ou dos desastres, naturais ou não, que diariamente afetam milhares, milhões de pessoas? Das doenças, velhas ou novas, que afetam multidões? Dos perigos de toda a sorte, vindos do espaço ou decorrentes de ações humanas, que podem mandar pelos ares, em segundos, o que se levou milênios para construir? É difícil, muito difícil.

Há, no meu caso, e no de muitas e muitas pessoas que exercem a mesma atividade que exerço, uma dificuldade toda especial, que nos amargura, até por ser recorrente. Envolve não apenas produção de textos, mas bom humor, otimismo, erosão da autoconfiança e, por consequência, um gosto amargo de fracasso.

É difícil, muito difícil, ser escritor no Brasil, a menos que você tenha muitos contatos, não precise exercer outra atividade remunerada para assegurar seu sustento e conte com boa dose de sorte. Ter talento, claro, está implícito nesta equação.

Lancei, em setembro de 2010, dois novos livros, “Cronos & Narciso” (crônicas) e “Lance fatal” (contos), cheio de confiança e de esperanças não de me tornar best-seller, campeão de vendas, mas apenas de não fazer feio e não fechar as portas para futuras publicações. Superestimei, todavia, o poder da internet (e principalmente das redes sociais). Por isso, não previ nenhuma outra forma de divulgação, como o assédio aos editores da área de cultura de jornais, noites de autógrafo etc. etc. etc. E... dei-me mal, muito mal.

Meus livros constituíram-se (salvo engano meu) num imenso vexame editorial. Não por não terem qualidade literária, mas pelo fato dos seus destinatários (os leitores) sequer saberem de sua existência. Achei que as vendas pela internet seriam mais fáceis. Afinal, este país, de dimensões continentais, dispõe de livrarias em apenas cerca de 600 dos seus 6.600 municípios, ou seja, menos de 10%. Enganei-me. As vendas foram tão baixas (ao menos pelo que eu soube) que não exagero ao dizer que foram praticamente nulas.

Ainda se isso se devesse a eventual avaliação negativa de críticos literários, eu me conformaria. Mas meus livros sequer chegaram às suas mãos. Como se vê, talento para escrever e qualidade do que é publicado não são suficientes para assegurar, já não digo recordes de vendas, mas até mesmo a comercialização de reles algumas dezenas de exemplares. Assim é difícil, muito difícil...

Boa leitura!


O Editor.


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Um comentário:

  1. A saída tem sido o e-book. Amigos me cobram a publicação de um livro. Respondo: caso publique terei um novo problema: vendê-lo. Ser lido na internet já é alguma coisa. O vexame é mesmo um texto publicado na internet ficar inédito.Mas fica, especialmente em feriados, férias e fins de semana.

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