sexta-feira, 17 de novembro de 2017

Jornalismo Literário


O que é mais impressionante, inverossímil, absurdo e chocante, a realidade ou a ficção? Diria, sem precisar pensar muito, apenas com base nos livros que já li, que a primeira. A vida real nos traz, amiúde, fatos e personagens tão insólitos, tão estranhos, tão esquisitos e insanos que chegamos a duvidar que tenham ocorrido (no primeiro caso), ou existido (no segundo).

A realidade é, pois, vastíssimo campo não apenas para o escritor, mas para o jornalista de talento que goste e saiba fazer literatura. Se souber explorá-la bem, com competência, paixão e método, poderá produzir obras marcantes, que se tornem, quem sabe, “imortais”. Aliás, muitos e muitos intelectuais brilhantes migraram e migram das redações para o estrelato no mundo das letras.


Há quem atribua o nascimento desse fenômeno ao norte-americano Truman Capote, com seu “A sangue frio”, sem deixar de dar a devida importância a nomes como Tom Wolfe, Gay Talese, Norman Mailer e Joseph Mitchel. Trata-se, não tenham dúvidas, de uma atribuição errada. O Jornalismo Literário já era praticado na Europa em meados do século XIX. E também no Brasil, no mesmo período. Não é, portanto, nenhuma novidade e muito menos invenção de norte-americanos.

O que é, por exemplo, o livro “Os Sertões”, de Euclides da Cunha se não meticulosa reportagem, muitíssimo bem escrita, encomendada na época da Guerra de Canudos pelo jornal “O Estado de São Paulo” (que na ocasião, se não me falha a memória, ainda se chamava “A Província de São Paulo”)?

O Brasil, aliás, não fica atrás de ninguém nesse tipo de “Literatura-Jornalística”, ou Jornalismo Literário, como queiram. João do Rio, por exemplo, foi outro que se destacou nessa vertente, embora seus textos não sejam (erroneamente) classificados como tal. Não citarei outros nomes para não maçar vocês, pacientes leitores. Mas que eles existem (e são muitos), não tenham dúvidas.

Nos anos 60, a revista “Realidade”, e o “Jornal da Tarde”, de São Paulo, impuseram, em suas redações, reportagens que iam muito além das técnicas jornalísticas convencionais de então (e de agora, diga-se de passagem). Embora sem deixar de ser jornalismo da melhor cepa, as matérias que publicavam eram, igualmente, a mais lídima das literaturas, posto que baseadas na realidade.

Não gosto de citar nomes, pois sempre que faço isso, cometo grandes injustiças, ao omitir quem não poderia e nem deveria ser omitido. Como não estou redigindo nenhum ensaio histórico, porém, apenas fazendo considerações à margem, cito, desta época de projeção do verdadeiro Jornalismo Literário no Brasil, os nomes de dois repórteres exemplares: José de Alencar e Otávio Ribeiro (este último conhecido como “Pena Branca”, por causa de uma mecha de cabelos branquinhos que tinha bem no meio da sua vasta cabeleira negra).

E por que abro essas exceções? Porque tive o privilégio e a honra de trabalhar com ambos, tidos e havidos, com a máxima justiça, como os dois se não melhores, entre os melhores repórteres policiais do Brasil em todos os tempos. Ambos eram “feras” e, com todo o respeito que tenho pelos meus companheiros de profissão, não vejo ninguém, hoje em dia, que nem de longe se lhes compare.

José de Alencar foi meu chefe no “Diário do Povo” de Campinas, em sua histórica passagem por esse quase centenário jornal que, infelizmente, já deixou de circular. Otávio Ribeiro eu conheci quando veio lançar seu livro-reportagem “Barra Pesada”, aqui, em nossa cidade, e me tornei de imediato seu fã incondicional, uma espécie de “macaca de auditório”. Colaborou, mesmo que à distância, com várias das minhas edições.

Para não ser completamente injusto, por omissão, com aquela brilhante equipe da Realidade, notadamente de 1966, destaco o nome de José Hamilton Ribeiro. Faço-o não somente por “bairrismo” (ele também atuou no jornalismo de Campinas, como diretor de redação do “Jornal de Hoje”, que em 1982 se fundiu com o Diário do Povo e foi absorvido por este), mas, sobretudo, pelo magnífico Jornalismo Literário que praticou. Este assunto, como se vê, renderia páginas e mais páginas e não somente esta ínfima e supérflua crônica, que não tem a mínima pretensão de se tornar resenha histórica.

Boa leitura!

O Editor.


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Um comentário:

  1. No curso de Jornalismo estudamos bem esse tema. Li "A milésima segunda noite na Avenida Paulista", de Joel Silveira. O moço é bom.

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