domingo, 19 de novembro de 2017

Espanto e surpresa

A capacidade de sentir (e de manifestar) espanto face a acontecimentos inusitados ou incompreensíveis e, sobretudo, com o mistério da vida, e surpresa diante de ações e reações (próprias e/ou alheias) é a principal característica das pessoas “inteligentes” (no sentido lato da palavra, ou seja, das que entendem, posto que minimamente, sua condição humana).

Muitos já não a têm. Alguns, nunca a tiveram. É uma lástima! Albert Einstein escreveu, em seu livro “Como vejo o mundo”, que “se alguém não conhece esta sensação, ou não pode mais experimentar espanto ou surpresa, já é um morto-vivo e seus olhos se cegaram”. Exagero do cientista? Longe disso!

Há quem jamais tenha sequer tentado fazer um exercício mínimo de racionalidade. Estes jamais se questionaram, por exemplo, sobre o que de fato são, qual a posição que ocupam na escala animal e que propósito suas vidas têm. Afinal, queiram ou não, tudo no universo tem algum motivo e objetivo, mesmo que não tenhamos capacidade de discernir quais são.

Há quem viva por viver. Estes são incapazes de raciocinar por si sós e têm que ser “programados” para exercer funções mínimas que os caracterizem como humanos. Argumenta-se, amiúde, com a falta de oportunidades dessas pessoas, o que não deixa de ser real. Para pensar, todavia, sequer é necessária qualquer instrução. Há pessoas analfabetas que, no entanto, são inteligentíssimas e entendem, mesmo que intuitivamente, o que muitos doutores, com inúmeros diplomas acadêmicos, jamais entenderão.

Nosso remoto ancestral, por exemplo, não tinha instrução nenhuma, óbvio. Não sabia ler e nem escrever, porquanto sequer o primeiro e rústico alfabeto havia ainda sido inventado. E, no entanto, soube como sair da caverna primitiva, domar a natureza, adaptar-se às suas forças e leis e lançar os fundamentos da atual civilização. O homem contemporâneo, com toda sua empáfia e arrogância, não passa de pigmeu intelectual. Tudo o que faz e que pensa, não passa, em certa medida, de plágio, posto que com acréscimos pessoais (pudera!) das obras e pensamentos dos remotos ancestrais. Só parece gigante por estar nos ombros deles.

Todos somos dotados desse mecanismo fantástico que nos permite, entre tantas coisas, nos espantarmos e nos surpreendermos. Afinal, todos somos dotados dessa capacidade que nos distingue não só dos demais animais, mas de todos os seres vivos: o raciocínio.
Como não se espantar ao contemplar, por exemplo, numa noite de Lua Cheia, o céu estrelado e ver, até onde nossa vista alcança, milhões, bilhões, quiçá trilhões de pontos de luz, cada um deles um sol, a maioria de dimensões até cinco vezes maiores do que o nosso, muitos dos quais com vários planetas ao redor e (conforme as probabilidades matemáticas) com cerca de 300 mil com o tamanho e as características da Terra? São habitados? Por que (tanto faz se a resposta for positiva ou negativa)? Em caso positivo, por quem? Há vida inteligente alhures? Onde?


Infelizmente, esse mistério não causa a menor emoção em muitos (diria, na maioria), que se julgam “realistas”, objetivos (na verdade não passam do que o jornalista Nelson Rodrigues classificava de “idiotas da objetividade”). A que realidade eles se referem?

Que realismo é esse em que os que se dizem dotados dele sequer intuem (e nem mesmo se questionam) “quem” (ou “o que”) são? Em que não os preocupa saber onde estão? Em que não manifestam a menor curiosidade sobre para que existem, e para onde vão, ao cabo de parcas dezenas de anos (se tanto), se é que há algum destino além deste, material?

Einstein concluiu (e por isso também merece a justa classificação de “gênio”, de um dos raros gigantes da espécie), que essa intensa emoção causada pelo mistério da vida “é o sentimento que sustenta a beleza e a verdade, cria a arte e a ciência”. Sem ela, estaríamos, todos, ainda, nas cavernas primitivas (se não fôssemos, claro, destruídos antes, o que é mais provável, dada nossa incrível fragilidade física, comparada à força dos demais animais), desorganizados, nos digladiando por comida, apavorados com os fenômenos naturais ao nosso redor, sem contar, sequer, com uma linguagem coerente para nos comunicar, grunhindo como os símios, com os quais temos algumas semelhanças.

Há tanta coisa que nos causa espanto e é mister que seja assim. Mas nossa condição humana exige que busquemos entender o que nos espantou, mesmo que não o consigamos. Temos o instrumental necessário para procurar esse entendimento. É nossa obrigação fazê-lo, até em respeito à nossa descendência.

Outrossim, não podemos deixar morrer em nós a capacidade de nos surpreender, com a beleza, com o horror, com a bondade latente, com a maldade, com a justiça, com a violência, com o bem e o mal etc. E, sobretudo, a de nos espantar, sempre, com os inúmeros mistérios que cercam a vida.

Boa leitura!

O Editor.



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