sexta-feira, 6 de outubro de 2017

Paraísos acima de qualquer suspeita


* Por Frei Betto


Paraísos fiscais são redutos legais para abrigar fortunas ilícitas. Neles o crime fica imune e impune.

Os EUA perdem, a cada ano, mais de US$ 100 bilhões em receita tributária, devido a depósitos bancários offshore não declarados, ou seja, sonegação e evasão fiscais por empresas transnacionais.

A Noruega, com 5 milhões de habitantes, estima que seus contribuintes possuem mais de US$ 35 bilhões em depósitos não declarados em paraísos fiscais.

Sigilo e evasão fiscal offshore são generalizados e enraizados no sistema financeiro mundial. Exemplos são os bancos suíços UBS e Wegelin. Em 2009, o UBS pagou multa de US$ 780 milhões por fraudar a Receita Federal dos EUA. O UBS enviou funcionários àquele país para convencerem contribuintes a abrirem contas bancárias secretas, ciente de que os ajudavam a cometer sonegação fiscal.


Em 2013, o banco Wegelin admitiu sua culpa ao ser acusado, em Nova York, de ajudar ricos clientes a sonegar impostos e esconder mais de US$ 1,2 bilhão em contas secretas. O banco fez campanha para que clientes que deixavam o UBS transferissem suas contas secretas para o Wegelin, onde continuariam a ser sigilosas e livres de tributos. O Wegelin pagou US$ 74 milhões em multas, reembolsos e por fundos perdidos, o que resultou no fechamento do banco.

A legislação de paraísos fiscais proíbe empresas controladas por estrangeiros de ter atividades produtivas no próprio paraíso fiscal. Assim, os investidores usam empresas fantasmas (shell companies) como veículos para transações comerciais. Essas empresas não têm nenhum ativo ou operações; são apenas uma personalidade jurídica, daí o termo empresa fantasma. Sem identificação de seus proprietários, se adequam perfeitamente a atividades criminosas.

Nas Ilhas Virgens Britânicas havia 830 mil empresas em 2012. A população local é de, aproximadamente, 31 mil habitantes.

Sigilos bancários e corporativos oferecidos pelos paraísos fiscais facilitam atividades criminosas de ditadores e políticos em geral.

Mobutu Sese Seko exerceu o poder na República Democrática do Congo (ex-Zaire) de 1965 a 1997. Sua posição política facilitava que roubasse da sociedade, e paraísos fiscais permitiam que escondesse o roubo. As consequências foram devastadoras: a receita per capita da população, em 1992, foi metade do que era na sua independência, em 1960.

Sani Abacha governou a Nigéria entre 1993 e 1998. Desviou de US$ 3 a 5 bilhões das reservas monetárias do país, escondendo o dinheiro em Jersey, Liechtenstein, Suíça e Reino Unido. Com a ajuda do advogado britânico Tim Daniels, a Nigéria conseguiu repatriar quase US$ 3 bilhões.

O presidente do Paquistão, Asif Ali Zardari, anteriormente casado com Benazir Bhutto, foi processado e condenado por corrupção no Paquistão, na Suíça e na Ilha de Man.

Tim Daniels lista 14 casos de presidentes e políticos que roubaram dinheiro de seus países. Os crimes foram facilitados pelo uso de paraísos fiscais.

E no Brasil... Ora, como diz Ancelmo Gois, deixa pra lá.


* Frei Betto é escritor, autor de “O que a vida me ensinou” (Saraiva), entre outros livros.



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