sexta-feira, 6 de outubro de 2017

Em busca do papel




Os pressupostos em que se baseia a civilização não resistem à mínima análise. Disfarçada sob uma tênue camada de verniz civilizatório, o que ainda impera é a lei da selva: a prevalência do mais forte sobre o mais fraco. A riqueza é o disfarce que se usa para dissimular a força bruta. Hoje não é o indivíduo com maior massa muscular ou mais perito no manejo de armas o que prevalece sobre os que lhe são mais frágeis ou indefesos. É o rico. É o que pode "comprar" essa montanha de músculos, ou essa máquina de coagir e matar, para impor e assegurar os seus interesses. E a maioria, consciente ou inconscientemente, apoia tal sistema ou pelo menos não se lhe opõe como deveria. A sociedade atual, tirando os recursos tecnológicos que facilitam a vida de milhões (vedados a dois terços da humanidade, que vegetam sob o espectro da fome, sem acesso à educação, moradia, saúde e segurança), é a reprodução fidelíssima do inferno, pintado por furibundos pregadores do passado (e alguns atuais) como castigo àqueles que não seguissem os dogmas que pregavam.

Todavia, em treze milênios de civilização, o homem ainda não se conscientizou do seu verdadeiro papel, "brincando" de viver, transformando o mundo em um circo de horrores, onde imperam o crime, a violência (física e principalmente social) e o desmedido egoísmo. No fundo, bem no íntimo da consciência, todos sabemos que os paradigmas que norteiam as relações humanas são errados. No entanto... relutamos em abrir mão deles ou nos insurgimos contra a sua modificação.

Nunca a vida foi mais desvalorizada do que neste século, que conheceu as maiores guerras jamais travadas pelos povos e um genocídio nuclear (Hiroshima e Nagasaki), que pode se reproduzir em escala um milhão de vezes maior, até acidentalmente. A morte é banalizada, até mesmo nas artes, como se matar uma pessoa (ou toda uma nação, como Adolf Hitler e Pol Pot, entre outros, tentaram, e quase conseguiram), fosse uma ação trivial, simples, meritória, como apagar um número de uma relação estatística. Em desespero, milhares de seres humanos, pelo mundo afora, recorrem ao suicídio, por entenderem que viver se tornou penoso. O que falta ao homem é definir o seu verdadeiro papel.

O escritor D. H. Lawrence, célebre por seu romance "O Amante de Lady Chaterley", que teve sua obra censurada como "pornográfica" e "atentatória à moral" e que não viu o livro ser publicado na íntegra (o que ocorreria apenas após a sua morte), criticou os pressupostos baseados no "ter", em detrimento do "ser". Escreveu: "O que queremos é destruir nossas falsas, inorgânicas relações, especialmente com o dinheiro, e restabelecer nossa relação orgânica e viva com o cosmos, o Sol e a Terra, com a raça humana e com a nação e a família". Imoral não é falar sobre sexo e erotismo, mas deixar pessoas morrendo à míngua, enquanto temos mais do que precisamos e desperdiçamos. Qual a razão do patrimônio da humanidade – que são os recursos do Planeta – estar entregue a pessoas tão medíocres, sem princípios e sem ideias, que os vêm depredando de forma estúpida e sistemática?

Boa leitura!


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