Mulher de roxo
* Por
Juliana Marques
Rua acima, rua abaixo, pés
descalços sobre o chão. Lá ia ela caminhando sem saber para onde,
mas tinha seu ponto de parada preferido, era em frente a uma loja
feminina, Sloper. Era lá que ela parava e ficava mergulhada no seu
mundo. Ninguém sabia de onde ela veio, se foi casada, se teve filhos
ou se tinha família pela cidade. Mas corriam boatos dela ter vindo
de uma família rica ou ter sido abandonada pelo noivo na porta da
igreja e, dessa maneira, ter enlouquecido. Talvez por esse motivo
enclausurou-se em um hábito roxo, parecendo ser uma freira de luto,
perambulando durante todo o dia pela Rua Chile, bairro movimentado
pelo pólo de economia da cidade.
Os transeuntes dali já a
conheciam por suas andanças diárias e sabiam que ela era
inofensível. As rachaduras em seus pés denunciavam o quanto aquela
pobre senhora já tinha andado nessa vida de meu Deus.
Alguns acessórios completavam
seu visual. Ela carregava um crucifixo no pescoço, juntamente com um
retrato, na altura do peito, de uma noiva, supostamente ela mesma, a
noiva abandonada no altar. O odor que exalava de seu corpo acusava a
falta de asseio que vencera alguns dias, meses ou até anos.
Como em uma das canções de
um cantor dessa Bahia linda; ela caminhava sem lenço e sem
documento... e sem destino. A única coisa que o destino reservou
pra ela foi tê-la tornado em um personagem lendário cheia de
mistérios e segredos no cenário baiano.
Florinda, nome dado pelas
pessoas que viveram naquela época e puderam acompanhar de perto o
cotidiano dessa andarilha, passou seus últimos dias de solidão no
Hospital Santo Antônio. Mas foi como a mulher de roxo que ela ficou
conhecida em toda a cidade, se tornando a maior lenda urbana de
Salvador.
* Jornalista
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