quinta-feira, 28 de julho de 2016

Para além das fachadas de Laguna


* Por Viegas Fernandes da Costa


Laguna é uma cidade fascinante. Fronteira sul do primeiro século da ocupação portuguesa na América, terceira cidade fundada em Santa Catarina, capital da inusitada República Juliana e palco do encontro de Garibaldi e Anita. É em Laguna que encontramos os botos que pescam junto com os homens, a curiosíssima Pedra do Frade e o majestoso Farol de Santa Marta, além do imenso conjunto arquitetônico tombado como Patrimônio Nacional pelo IPHAN. A despeito disto tudo e dos investimentos realizados pelo Governo Federal no restauro de vias e fachadas, o poder público municipal trata os equipamentos culturais de Laguna com um descaso criminoso.

Na última sexta-feira estive visitando a Biblioteca Pública Municipal Professor Romeu Ulysséa, abrigada em um prédio construído em 1864. Apesar da dedicação dos seus funcionários, já na entrada é possível perceber que a biblioteca está abandonada a sua própria sorte. Poucas estantes, acervo defasado, caixas com livros espalhadas pelo espaço, equipamentos obsoletos e falta de investimentos. Não à toa, torna-se cada vez menos procurada pelos leitores.


No Museu Histórico Anita Garibaldi a realidade é ainda mais deprimente. O prédio, tombado pelo IPHAN, sede do governo da República Juliana em 1839, está restaurado e em bom estado de conservação. Já o acervo e o atendimento ao público, sob gestão do município, deixam indignados os visitantes minimamente exigentes. O atendimento é feito por adolescentes que desconhecem a história do local, da cidade e das peças expostas. Praticamente não há monitoramento e se observa claramente que os atendentes não passaram por qualquer tipo de treinamento. As coleções são confusas, com peças de diferentes contextos misturadas e sem material interpretativo. Se existe um plano museológico, este então não foi aplicado. Apesar da importância e do valor histórico de algumas peças, tudo é muito caótico e o acervo não conta com cuidados mínimos de conservação, exposto à claridade solar, à umidade, ao vento e ao alcance das mãos.

Por fim, o Morro da Glória, onde está instalado o monumento de Nossa Senhora da Glória, esculpido em 1953 e assinado pelo escultor Alfredo Itaege. A vista que se tem da cidade de Laguna e de toda a região do alto do Morro da Glória é lindíssima. Pena que o monumento dispute espaço com as inúmeras torres de telecomunicações e que o abandono do local seja gritante. Sujeira, mato, ausência de sinalização. É tanto mato que partes do mirante tornam-se inacessíveis aos visitantes. Uma lástima!

Quando vemos o estado a que estão relegados os equipamentos culturais e turísticos sob gestão do poder municipal, percebemos o quão distante a região está de se transformar em uma referência em serviços turísticos, como pretende o projeto proposto pelo SEBRAE e que articula Laguna a Imbituba e Garopaba.

Laguna, por toda a sua importância e referência simbólica na história brasileira, precisa rever urgentemente sua política de gestão e conservação do patrimônio cultural. Afinal, nenhuma cidade sobrevive apenas de fachadas.


* Historiador e Professor do IFSC 


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