quinta-feira, 30 de junho de 2016

A fuga


* Por Conceição Pazzola


Abriu a porta devagar e o vento da noite penetrou nos seus poros, quase o fazendo retroceder, voltar para a cama quentinha e esquecer tudo. Há dias martelava o juízo imaginando a hora da decisão. Não havia mais lugar para o arrependimento.

Estava cansado de discussões que não levavam a nada. Segurou a alça da mala já pronta aos seus pés, fechou a porta de mansinho e saiu pelo corredor. Àquela hora da madrugada, nem viv’alma. Chamou o elevador sem olhar para trás, quando chegou arrastou a mala e apertou o térreo.

Subitamente, o elevador parou entre um andar e outro. Que fazer? Os minutos passaram, transformaram-se em horas e nada aconteceu. Suando em bicas, apertou o alarme na esperança de que alguém com insônia ouvisse, mas nada aconteceu. Sem ter o que fazer, resignou-se; deitou no chão e ali adormeceu.

Não sabe quantas horas dormiu. De repente, a porta do elevador abriu e uma mulher entrou. Ao vê-lo estirado no chão, julgou que estivesse morto e se pôs a gritar. Em breve, acudiu gente de toda parte, e segurando a porta do elevador o suspenderam nos braços na intenção de socorrê-lo, sem lhe dar tempo de explicar-se o puseram num táxi e o levaram para o hospital mais próximo.

Cada vez mais irritado, viu os enfermeiros acudirem e o carregarem numa maca para o internamento. Gritou que estava bem, estivera apenas dormindo no elevador que se quebrara desde a madrugada. O médico que o atendeu balançou a cabeça e disse que haviam errado de endereço. Aquele homem, referindo-se a ele, precisava ser internado com urgência num manicômio.

Sem esperar que os bondosos vizinhos obedecessem ao médico, ele correu para a porta do hospital apavorado, atravessou a rua e desapareceu dentro do metrô.


* Poetisa e contista

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