quinta-feira, 22 de outubro de 2015

Nem tanto ao céu nem tanto à terra

A Literatura tem alguma importância prática em nossa vida, ou não passa de mero passatempo (posto que muito agradável), uma espécie de refinado lazer? Essa é uma pergunta recorrente, que faço continuamente, a mim mesmo e a outros (escritores ou não) e a resposta, invariavelmente, é no sentido de exaltar, mesmo que moderadamente, seu valor. Nem tanto ao céu, nem tanto à terra. Trouxe este tema à baila vezes sem conta e, portanto, não é necessário que meus críticos gratuitos (aqueles que só vêem defeitos no que escrevo, sem reconhecer qualquer virtude) venham me dizer que estou sendo repetitivo. De fato, estou! Prefiro, entretanto, afirmar que estou sendo “reiterativo” e a reiteração é uma espécie de rotina na profissão que exerço: o jornalismo.

Como admiti em uma das minhas tantas crônicas a propósito – admissão que faço sem nenhum constrangimento – sou suspeito (suspeitíssimo) para opinar sobre a importância da Literatura, posto que vivo dela. E, há tempos (mais de 60 anos) em suas duas principais vertentes; na condição de leitor e na de produtor. Em ambas tive satisfações (muitas) e decepções (razoáveis). No primeiro caso, tive o privilégio de ler livros que, se não mudaram os rumos da minha vida (alguns mudaram), determinaram minha visão de mundo. Contudo, decepcionei-me com determinadas obras literárias (minhas e de terceiros), até mesmo bem escritas em termos formais, mas... ocas. Totalmente sem conteúdo. São os tais livros que podem (e devem) ser enquadrados na categoria de “bonitinhos, mas ordinários”. Não citarei nenhum para não ferir suscetibilidades e para conservar uma norma que adotei e que, para mim, é regra inflexível, uma espécie de “cláusula pétrea”: a de não destruir e nem contribuir para a destruição de nenhum escritor, por pior que ele seja. Entendo que sempre possa melhorar e, quem sabe, tornar-se “excelente”.

A Literatura, para mim, é muito mais do que meio de aprendizagem e forma sofisticada e nobre de lazer (embora seja, “também”, tudo isso). É o meio pelo qual obtenho meu sustento (aí considerando o jornalismo, que se vale de muitas técnicas literárias e das mesmas ferramentas: as regras do meu idioma). Entendo, todavia, que a Literatura é muito importante para a “fermentação” de idéias, para o estudo do comportamento das pessoas e para me indicar, sobretudo, o que não devo fazer, caso tenha intenção de obter sucesso no que me empenho e na convivência do dia a dia. Neste ponto estou, propositalmente, sendo repetitivo. Aliás, na verdade, reiterativo. Contudo, sou, principalmente coerente. Pelo menos nesse aspecto, não me contradigo.

Todavia, os relativamente muitos anos que vivi alteraram, ligeiramente, minha visão sobre a importância da Literatura. Quando mais jovem, imbuído de idealismo, considerava que ela era “absoluta”. Hoje sei, talvez só intuitivamente, que é apenas “relativa”, Nem é inútil, como acusam os que não sabem ou não gostam de ler (uma infinidade de pessoas, sobretudo no Brasil, onde é atividade de risco, eivada de frustrações e decepções de toda a sorte) e nem essencial à vida, como pretendem os que a produzem (e como eu pretendi há não muito). O ensaísta escocês, Thomas Carlyle, advertiu a propósito: “A literatura é o vinho da vida, mas não pode ser o seu alimento” (já citei esta declaração). A bebida, se tomada com moderação, nos dá prazer. Mas se ingerida em excesso... embriaga, não alimenta e, para complicar, pode viciar. E vício algum, convenhamos, é minimamente recomendável

Se a Literatura é importante na vida das pessoas (e estou absolutamente convicto que é, mesmo que relativamente), qual é seu verdadeiro papel no estudo dos seres vivos (principalmente dos humanos)? Para quê ela serve? Para divertir, ou para instruir, orientar, analisar e concluir? Alguém pode, a esta altura, perguntar: “mas não temos a ciência para isso?”. Temos. Mas somente ela não basta. A vida (pelo menos para o “Homo Sapiens”, único animal dotado de razão), não se restringe a leis naturais e imutáveis. Ademais, nenhum ser vivo reage de forma absolutamente igual. Ela é sutil e não comporta análises mecânicas e genéricas. Para sua compreensão, são necessários exemplos, das várias formas de comportamento das pessoas. Ainda assim, somos incapazes de compreender em profundidade esse maravilhoso mistério, esse privilégio, essa magnífica aventura que é viver. O escritor, sociólogo e filósofo francês, Roland Barthes, constatou: “A ciência é grosseira, a vida é sutil, e é para corrigir essa distância que a literatura nos importa”.

Nem todos livros, todavia, nos ensinam adequadamente, ou mesmo nos divertem sem nos aborrecer, já que o aborrecimento não se coaduna com diversão. Diria que, apenas, 10% (sendo sumamente otimista) preenchem uma dessas condições e um percentual bem menor satisfaz a ambas. Dependem, claro, do conteúdo, mas não apenas dele. A forma também é importante. Os livros têm que ser claros, corretíssimos, e em estilo limpo, simples e atrativo. E são poucos os escritores que conseguem aliar as duas características. Creiam-me, não estou sendo pessimista. Além do que, a utilidade ou inutilidade de determinada obra, depende bastante de quem a lê. O polêmico e temperamental filósofo alemão, Friedrich Nietzsche, opinou: “Os leitores extraem dos livros, consoante o seu caráter, a exemplo da abelha ou da aranha que, do suco das flores retiram, uma o mel, a outra o veneno”. E não é o que ocorre?!!! Pense nisso!

Boa leitura.

O Editor.

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Um comentário:

  1. Dependendo do que a pessoa tem dentro de si, seu conteúdo e seu momento, vê a obra, forma e conteúdo, de maneira até oposta a uma outra pessoa. A releitura pode trazer visão e sensação diferentes, pois na segunda vez é provável que o leitor ainda esteja sob influência da primeira e numa outra etapa. Também com os filmes isso ocorre.

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