sábado, 25 de julho de 2015

Flor de ipê


* Por Lúcio de Mendonça

Na clara estação gorjeada,
Em flor o ipê se desata;
Ó bela árvore dourada!
Ó loura filha da mata!
O tronco, o pai, se revê
Todo ufano, todos zelos,
Nesses teus áureos cabelos
Que o sol beija, ó flor de ipê!
As abelhas, jóias vivas,
Adereçam-te o toucado;
Diz-te frases expressivas
O sabiá namorado;
De ramo em ramo o tiê
Cai, com gota de sangue;
E a coral se enrosca langue
Nos teus braços, flor de ipê!
Mas, ai! tanta formosura,
Tão festejada e querida,
Pouco tempo vive e dura,
Logo cai a flor sem vida;
E sombrio e nu se vê,
Mudo, trágico, isolado,
Como um pai desamparado,
O velho tronco do ipê.
Na alegre quadra encantada
Dos sonhos e da esperança.
Vestiu-te a ilusão dourada
O coração de criança;
Surgiu-te - meu Deus! por quê? -
Ante os passos peregrinos
Crianças de olhos divinos,
Loura como a flor do ipê.
Sonhos de que te cobriste,
Coração em primavera,
Caíram, todos, ai, triste!
Quanta dourada quimera!
Eis-te da sorte à mercê,
Já sem viço, já sem flores...
Aqueles pobres amores
Foram como a flor do ipê!


(Canções de outono, 1896).


* Advogado, jornalista, magistrado, contista e poeta, membro da Academia Brasileira de Letras.

Nenhum comentário:

Postar um comentário