quinta-feira, 28 de maio de 2015

Uma família para Feliciano

* Por Gustavo do Carmo


Depois de tantas frustrações românticas, aos 37 anos, Feliciano, enfim, arrumou uma namorada. Mas ela era divorciada e tinha um filho. E isso era um grande problema para ele, que odiava crianças.  

Feliciano não tinha paciência, principalmente com manhas e pirraças, e se envergonhava de falar em linguagem “tate-bitate”.  Também não se achava maduro para ensinar e dar conselhos. Tinha medo de ser agressivo demais para corrigir e permissivo demais para agradar.

Ele poderia até conquistar a confiança da criança, mas aí teria que disputar a sua atenção com o pai dela. Tinha medo de jogar o guri (ou a guria) contra ele, o que não era a sua intenção. E também não desejava aturar a interferência de direito dos avós paternos e de outros membros da família do pai biológico também.

Isso tudo era uma aporrinhação que Feliciano preferia evitar. Mas não conseguiu. Acabou se apaixonando por Marielle e Oscarzinho, seu filho de cinco anos. No início, ele pensou em desistir do romance quando descobriu que ela tinha um filho pequeno.

Se convenceu de que estava ficando velho e as mulheres mais velhas, com as quais sempre sonhou, já estavam ficando idosas e entrando na menopausa. Feliciano queria ter filhos, sim. Mas só dele, para amar e criar à sua maneira, e não para cuidar de crianças dos outros. As moças da sua faixa de idade já estavam com filhos e as mais novas, mesmo que não fossem imaturas, o deixariam com a sensação de ridículo ou pedófilo.    

Oscarzinho era muito educado e aceitou muito bem o padrasto. Feliciano perdeu o medo de repreender o garoto quando ele fazia manha, mas conseguiu domá-lo. E o menino lhe obedecia prontamente. O que Feliciano conseguiu foi a confiança e o amor verdadeiro do menino (com quem jogava videogame até a alta madrugada, mas ralhava quando ele não queria comer, fazia alguma arte ou pirraça) e de Marielle. Conquistou, também, a amizade do pai, dos avós paternos, tios e primos de Oscarzinho.

Casou-se com Marielle em cerimônia e festa que reuniram as famílias de todos os lados. Ganhou um emprego de roteirista em uma produtora de cinema, indicado por um primo de Lucas, o ex da sua esposa e pai de Oscarzinho. O medo que Feliciano tinha de crianças e de conviver com a família do pai delas se evaporou. Tanto que Feliciano deu um segundo filho, uma menina, para Marielle. Oscarzinho, obviamente, ficou muito feliz com a irmã.

Feliciano estragou tudo quando descobriu que Marielle estava retomando o seu casamento com Lucas e levando os filhos, inclusive Mariângela, a dele.  Esbofeteou a traidora, que se desequilibrou, caiu da varanda do apartamento no sexto andar e não resistiu. Passou a ser odiado pela família dela, de Lucas e pelo próprio Oscarzinho.
 
* Jornalista e publicitário de formação e escritor de coração. Publicou o romance “Notícias que Marcam” pela Giz Editorial (de São Paulo-SP) e a coletânea “Indecisos - Entre outros contos”.
Seu  blog, “Tudo cultural” - www.tudocultural.blogspot.com é bastante freqüentado por leitores


5 comentários:

  1. Você traiu o leitor. Deu um fim trágico e súbito demais. Deveria ter prevenido a gente dizendo assim: Marielle subiu na varanda do sexto andar...

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  2. Eu vou mudar o final então. Mas aqui no Literário vai ficar para uma próxima. Obrigado pelo toque.

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  3. Este comentário foi removido pelo autor.

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  4. Não mudei o final. Apenas corrigi a cena da morte da Marielle, que estava exagerada. Está lá no meu blog. Já pedi para o Pedro atualizar aqui também.

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