segunda-feira, 20 de abril de 2015

Bona-chira


* Por Daniel Santos


A mesa no centro da sala – péssimo para quem se envergonha de comer à vista de todos. Por isso, talvez, raros se serviam; ainda assim, com afetada contrariedade, como se satisfação implicasse desconforto.

E era mesa que apetecia, tal a fartura de pitéus. Mas, como ocorre na maioria das festas, também ali mais valia jejuar que encher o bandulho. Ou assim acreditavam os educados no azedume de alguma religião.

No entanto, às tantas, surgiu alguém convidado de alguém. Um tipo estabanado – parecia. Chegou falando alto e cumprimentando mesmo desconhecidos efusivamente, com um sorriso radiante e permanente.

Tagarela como ele só, serviu-se à farta do que bem quis. E repetiu! Sim, repetiu! A cada bocada, uma interjeição gozosa, um elogio aos anfitriões, um esgar quase lúbrico nos lábios. O prazer rompia o dique.

De quebra, fez amigos, contou piadas e até dançou, enquanto os demais mal suportavam tanto bem-estar. Despediu-se, afinal, e lá se foi  satisfeito, porque soube tirar da mesa o que ela oferecia. Simples assim.

* Jornalista carioca. Trabalhou como repórter e redator nas sucursais de "O Estado de São Paulo" e da "Folha de São Paulo", no Rio de Janeiro, além de "O Globo". Publicou "A filha imperfeita" (poesia, 1995, Editora Arte de Ler) e "Pássaros da mesma gaiola" (contos, 2002, Editora Bruxedo). Com o romance "Ma negresse", ganhou da Biblioteca Nacional uma bolsa para obras em fase de conclusão, em 2001.

Um comentário:

  1. Algumas vezes é preciso deixar de lado algumas convenções. Porém, abaixo o exagero.

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