quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

O homem e sua incalculável capacidade de destruição

O potencial humano para criar, fazer, construir obras, sobretudo as materiais, embora limitado dada a própria fragilidade do homem, é imenso. Pode-se dizer que é tamanho, que se torna impossível de delimitar com razoável precisão. Depende, claro, da capacidade de iniciativa, do poder de convencimento e de mobilização dos “construtores”, além da existência ou não de recursos para tornar concreto o que idealizam  e... da necessidade. Esta é a mola-mestra por excelência  dos grandes empreendimentos. No pólo extremo, porém, está a capacidade humana de “destruição”, que é, desconfio, “n” vezes superior à de construção. Basta ver quantos monumentos, edificações e obras de todos os tipos e tamanhos o homem já destruiu, principalmente através de guerras que mancham de sangue e desolação toda a História. Praticamente nada escapa incólume da sua sanha destruidora quando posta em marcha.

Por exemplo, hecatombes, catástrofes naturais e a passagem do tempo não conseguiram arrasar a obra do hábil engenheiro que projetou a Grande Pirâmide do Egito, a de Queops. O vento, as tempestades e a erosão, que destruíram tantos monumentos, palácios, cidades e até países do passado, mundo afora, desgastaram, somente, 9,44 metros dos seus 146,60 metros originais, reduzindo-os para os atuais 137,16 metros. No fim do século XII da nossa era todo o Egito foi arrasado por devastador terremoto que deixou Cairo totalmente em ruínas. Edifícios reforçados, tidos e havidos como sólidos e indestrutíveis, erguidos em terreno firme e com a mais avançada técnica de construção da época, foram, todos, parar no chão, como fragílimos castelos de cartas. A capital egípcia transformou-se, em um piscar de olhos, em gigantesca montanha de escombros, sem que nenhuma casa, palácio, templo etc. permanecesse de pé. Houve, porém, uma exceção: as pirâmides. E a maior delas, a de Queops, não sofreu nada, absolutamente nada com o arrasador terremoto. Nem mesmo um simples bloco de pedra moveu-se do lugar.

Para a Grande Pirâmide, o poderoso abalo sísmico significou pouca coisa, aliás, literalmente nada. Afinal, “pode” ter sobrevivido (não estou afirmando que sobreviveu, mas também que não) a uma catástrofe bem maior: ao afundamento no Oceano Atlântico do mítico continente da Atlântida. Por que não? Quem garante que essa monumental obra não foi construída antes desse cataclísmico evento? Todavia, o que a natureza não conseguiu em vários milênios, a ação humana, em poucos pares de anos fez. Não destruiu Queops, que lá está, firme e forte e bastante sólida. Todavia, depredou-a severamente. Saques e invasões predatórias de diversos povos, em busca de pretensos tesouros dos faraós, deixaram marcas profundas na Grande Pirâmide. É certo que não abalaram sua estrutura. Todavia, descaracterizaram-na e reduziram muito sua magnificência.

Por exemplo, para reconstruir suas casas, arrasadas pelo terremoto do século XII, os egípcios retiraram a parte mais bela de Queóps, ou seja, suas reluzentes pedras calcárias brancas, que faziam desse monumento gigantesco farol que refletia os raios solares por toda a região, por milhares de quilômetros, a ponto de ser conhecida no passado como “Luz”. Hoje, esse revestimento está ornando inúmeros e magnificentes palácios do Cairo, com suas inscrições hieroglíficas que, se decifradas, poderiam lançar muita luz no mistério, quem sabe, até da origem da civilização humana. Os povos dessa região agiram da mesma maneira, por exemplo, que os turcos e os gregos em relação ao Panteão de Atenas, privando a humanidade de um dos seus mais preciosos tesouros.

A verdadeira riqueza dessas obras de engenho e arte, ao contrário do que seus predadores julgavam (e que muitos acreditam ainda hoje) jamais esteve em seu interior. Sempre foram elas próprias, em sua integralidade, em seu conjunto, em seu todo. Uma parte da graciosa mesquita do Sultão Hassan, no Cairo, por exemplo, foi construída com as pedras de calcário branco que revestiam Queóps. Até por isso, esse templo muçulmano é o justamente considerado o mais belo dos cerca de trezentos existentes na cidade. Com que direito os egípcios (e outros povos), não só do século XII, mas de todas as outras épocas dilapidaram, dessa forma tão estúpida, esse patrimônio que é de toda a humanidade? Essa prática, de usar Queóps e as pirâmides vizinhas, como gigantescos depósitos de materiais de construção durou séculos e apenas foi interrompida em virtude do seu alto custo e das dificuldades logísticas e riscos de se retirar e transportar blocos tão pesados, situados a imensas alturas, através de grandes distâncias.

Seja qual for o propósito, não deveriam ser permitidas pesquisas que implicassem em alguma forma de depredação das pirâmides, como aconteceu, por exemplo, em 1985, com a equipe de arqueólogos franceses, que no final das contas não resultou em nada de prático, de útil ou de novo. Perfurações nas paredes, explosões com dinamite, escavações com picaretas e outras tantas formas de descaracterizar a obra original deveriam ser terminantemente proibidas, para que as gerações futuras, as dos remanescentes da potencial hecatombe nuclear que mais dia menos dia pode ocorrer (se é que possam restar alguns) saibam que nem todos os homens se dedicaram às guerras e à destruição. Para que tenham, quase intactos, diante de si, magníficos monumentos, construídos por este estranhíssimo animal que pensa, que resistiram ao embate dos milênios e escaparam, quase incólumes, como testemunhas concretas do engenho e inteligência humanos.

Boa leitura.


O Editor.

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Um comentário:

  1. Somos a própria destruição e nunca nos emendamos diante dos desastres anteriores.

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