sábado, 28 de dezembro de 2013

Confissões

* Por Clóvis Campêlo


A burguesia fede, a burguesia quer ficar rica.

A classe média também. Espremida entre os donos do poder no mundo e os deserdados e excluídos, a classe média treme. Mas, afinal quem somos nós? Como se definem os limites desse segmento social tão importante e ao mesmo tempo tão insignificante em suas aspirações pequenos-burguesas?

Uma grande definição das contradições da nossa classe média, foi a mim dada pelo amigo e vizinho José Carlos de Paula, um cearense radicado no Recife há muito tempo.

Quando daquele acidente aérea da TAM em São Paulo, o maior da nossa história (a imprensa burguesa sempre faz questão de super-dimensionar os fatos, torná-los hiperbólicos para vender mais e melhor as notícias), o meu amigo Zé disse que estava com a consciência tranquila em relação à "tragédia" e essa tranquilidade lhe havia sido transmitida por um dos sobreviventes ao falar em cadeia nacional que Deus é que lhe havia salvado a vida. Ora, se ele havia sido um dos escolhidos para não morer, juntamente com outros que também escaparam do monumental acidente, por que chorarmos a morte dos que não foram escolhidos para a vida? Existe aqui uma tremenda contradição sentimental e religiosa. Afinal, quem somos nós para duvidarmos dos designios divinos, não é mesmo? Por mais que William Bonner tentasse me convencer do contrário e tentasse culpar o Governo pelas estrias da pista, Zé Carlos me parecia mais convincente.

Por analogia, eu pergunto: por que devemos sempre chorar a morte dos filhos da classe média, quando diariamente são mortos e exterminados, sem nenhuma complacência, de susto, de bala ou vício, os filhos dos excluídos, dos comedores de siri na beira das marés e nas palafitas que enfeiam as nossas cidades? Afinal, em que categoria social mais se morre e se é exterminado? A classe média paga alto para chorar os seus filhos mortos. Os excluídos, nem esse direito têm.

Morremos porque a morte faz parte da vida e também porque vivemos no fogo cruzado de tensões sociais que, na maioria das vezes, nem sequer entendemos.

O sistema, independentemente de que momentaneamente está no seu comando, está se lixando para isso. Isso não lhe interessa. A sua preocupação é outra, são os lucros, os números, os superavits. Quem quiser que se exploda. Ou que exploda o outro. Para ele, somos acessórios descartáveis e interessantes apenas enquanto podemos lhes ser úteis.

A origem da violência urbana pode ser explicada sob vários ângulos ou concessões filosóficas e ideológicas. Cada um pode escolher a que melhor lhe cabe, convém ou consola.

Poeta, jornalista e radialista


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