domingo, 24 de novembro de 2013

No princípio era a aula

* Por Deonísio da Silva


Os alunos são os mesmos há milhares de anos, mas aprendem de modo diferente, de acordo com a época e com o país onde vivem.

Há mais de dois mil anos, já se ensinava na Grécia, onde começou a civilização. Naquele país se falava o grego. A palavra ´aula´ veio do grego aulé. Mas aulé não era  aula ainda, era palácio. Era ali que o professor ensinava.  E ensinava também na skholé, o tempo livre, gasto nos banhos públicos, nas termas. Enquanto cada um aguardava  a sua vez, ele ia ensinando a todos os que ali estavam.

Só que ele não era chamado professor. Na Grécia, quem ensinava as crianças era o paidagogós. Ele não era pai nem tio dos alunos. Era apenas um escravo culto, encarregado de dar lições para as crianças no aulé, isto é, no palácio. Era ali que ele ensinava quando estava chovendo ou fazia muito frio.

Pois o paidagogós não ensinava apenas dentro do palácio. Ensinava também no jardim, no pomar, à beira dos rios, nos gramados. Os alunos ficavam a seu redor ouvindo o que ele lhes ensinava.

Nem sempre ele ficava parado. Às vezes ensinava caminhando e os alunos, grandes ou pequenos, o seguiam, pois também os adultos eram ensinados assim.

O filósofo Platão, por exemplo, gostava muito de ensinar na Akademía, um pomar que ficava à beira do rio Cefiso, perto de Atenas. O lugar tinha este nome porque os gregos tinham erguido ali a estátua de um herói chamado Akademo. É por isso que até hoje as instituições que cuidam das letras são chamadas de academias.

Tal como hoje, os países viviam em guerra. E Roma invadiu a Grécia. A Grécia já tinha invadido outras regiões também, de onde trouxera pessoas, algumas muito cultas, que ensinavam coisas aos inimigos que as tinham derrotado.

Muitos vencidos não eram bons no manejo das espadas, mas eram ótimos no manejo das palavras. E os vencedores ganharam muito por terem deixado de matá-los, pois os ganhadores aprenderam com os perdedores.

De todo modo, antigamente, na Grécia e em Roma, um escravo que ensinava ganhava mais do que um professor ou professora hoje em dia. E ninguém o maltratava. Ao contrário, todos o admiravam e reconheciam o seu trabalho.

Podemos dizer que, vistas deste modo, as coisas pioraram muito desde então. Há jogadores de futebol que, mesmo não ensinando nada a ninguém, ganham num mês o que uma professora jamais ganhará a vida inteira.

Quando invadiu a Grécia, Roma trouxe escravos de lá. E esses escravos foram  professores dos romanos. Mas como os romanos falavam latim, aulé virou aula, akademía virou academia, skholé virou schola  e paidagogós virou paedagogus.

* Escritor, Doutor em Letras pela USP, autor de 30 livros, alguns transpostos para teatro e TV. Assina colunas semanais na Caras e no Observatório da Imprensa. Dirige o Curso de Comunicação Social da Universidade Estácio de Sá, no Rio.


Nenhum comentário:

Postar um comentário