quarta-feira, 27 de novembro de 2013

Meus pais e eu (Parte II)

* Por Fernando Yanmar Narciso

Então, aconteceu o que até quem já morreu sabe. Roberto Jefferson, o bandido mais patriota do país, o advogado que costumava apresentar O Povo Na TV ao lado de Serginho Mallandro e Cristina Rocha no início da década de 80 (Moe, Larry e Curley?), veio cheio de boas e más intenções e denunciou o “maior escândalo político da história do Brasil.” Devolveu a cabeça de Lula, Zé Dirceu e do partido em geral para a oposição, deixou a nação chocada, quebrada e estrelada na manteiga e, de quebra, fez o país voltar a odiar política.

Em casa, mãe costumava ser a grande militante. Pai, apesar de já ter apoiado bastante o PT, é oriundo de uma família basicamente de direita e preferia não entrar na trincheira como nós dois, apesar de já ter brigado com alguns em defesa de Lula e outros integrantes do partido. O escândalo abriu feridas profundas em nossa família. Mãe rompeu laços com o partido em 2006. Meu pai, seguindo a mentalidade reacionária de sua família, se fartou do PT, de Lula e acha que todo petista é bandido e devia pegar prisão perpétua.

Ele me diz que José Genoíno era um de seus grandes heróis na juventude. Agora, para ele, não serve nem como ração de urubu. Se o escândalo teve um ponto importante, foi que ele serviu para expor as pessoas como elas são. A sinceridade extrema tomou conta da internet, mas a maioria das pessoas extrapola no ódio ao PT: O touro, todo ensanguentado no centro da arena, com as banderillas espetadas pelo corpo, o florete do toureiro fincado na cabeça e a audiência ainda quer fazer um sashimi com o bicho! Minha impressão é que a única diferença entre os tais mensaleiros e o povo nesse instante é que eles estão atrás das grades e nós não.

E eu, no meio de tanta animosidade, onde fiquei? Digamos que tenho agido como uma espécie de Suíça entre os dois mundos. Ano passado, quando o julgamento do mensalão começou, embarquei no sentimento de retaliação do povo brasileiro e, principalmente, de meu pai. Ele virou um fã confesso de Joaquim Barbosa, por sua postura truculenta como relator do caso. Segui a corrente até me dar conta que as pessoas apóiam Barbosa justamente por ele ser autoritário e se recusar a ceder, agindo mais como um déspota que como um democrata. No espetáculo midiático, ele foi adotado como um Charles Bronson de capa preta, um vingador “em nome do povo” e da grande mídia, por isso mãe o odeia.

E, para aqueles que queriam uma prova que Joca esteve jogando para a torcida todo esse tempo, eis que, por um acaso no dia da Proclamação da República, ele ordenou prisão imediata dos 12 principais condenados no julgamento, praticamente na marra e de forma quase criminosa. Houve gente aplaudindo, gente criticando, mas pelo menos “tudo” terminou. O país esperava que os mensaleiros saíssem de casa algemados e cabisbaixos, atitude esperada de qualquer bandido, mas se desapontou ao vê-los estendendo os punhos e dizendo “Nossa luta continua!” Uma provocação à moral e aos bons costumes ou uma convicção? Surpreendentemente, o único a dar uma de O.J. Simpson foi o Henrique Pizzolatto, que praticamente assumiu sua parcela de culpa no cartório ao fugir do país e agora é perseguido na Itália até pela Interpol. E ele nem é político nem nada. Quanto nós não pagaríamos pra ver Dirceu dando um chapéu nas “puliça” no lugar do Pizzolatto...

O pior de tudo é que a coisa mais importante do caso, o Santo Graal, o principal alvo das investigações do caso continua sem solução: CADÊ OS MILHÕES DESVIADOS PELO ESQUEMA? Por que a PF parou de procurar aquela dinheirama absurda, apontada pela papelada que o ex-procurador geral Roberto Gurgel leu no 1º dia de julgamento? Onde essa bufunfa poderia estar? Embaixo do colchão de Dirceu? Quem sabe naquela casinha modesta onde Genoíno morou por 40 anos, que mais parece a choupana de palha da Marimar! Estaria nos bolsos de Roberto “Garganta Profunda” Jefferson? Só o tempo nos dará essas respostas... 

“Eu não sabia”... O povo já se acostumou há séculos com as mentiras dos políticos, mas quanto exatamente de deboche e/ou sinceridade poderia haver nessas três palavrinhas? Se o STF provou por A+B que a versão corrente do caso é a única possível, por que os condenados não puseram a boca no mundo e entregaram uns aos outros, como costuma acontecer em qualquer filme de tribunal americano? Quer dizer, os outros presidiários já escolheram qual manteiga vão usar em sua encenação de O Último Tango em Paris, quer hora melhor para começar uma rinha entre os condenados? Mas não. Eles aceitaram as sentenças tão numa boa que é quase inspirador... De qualquer modo, mesmo com tantas tribulações, nossa família continua bastante unida. Eu, pai, mãe... E o partido.

*Designer e escritor. Sites:


Um comentário: