quarta-feira, 31 de julho de 2013

Sua melhor imagem

* Por Fernando Yanmar Narciso

Todos têm aquele lado sombrio, que nos humaniza e impede que sejamos iguais uns aos outros. Geralmente não gostamos quando essa porção de nosso caráter vem a furo. Você não pode falar assim, tem criança olhando! Que tipo de exemplo pretende dar a elas com um espírito de porco desses? Vista a máscara da falsidade e continue posando de bom moço, é mais seguro e te mantém empregado.

O ilustre sucupirano Nezinho do Jegue, criado pelo imortal Dias Gomes, possuía um estranho caso de múltipla personalidade. Geralmente, era o maior cabo eleitoral do histórico político Odorico Paraguaçu, e não perdia uma chance de passar mel no coronel da pacata Sucupira. Porém, bastava mandar pro bucho um copo de cana e o fenômeno Dr. Jekyll/ Mr. Hyde vinha à tona. Virava um ferino combatente dos desmandos do prefeito, mandando um MORRA, ODORICO em qualquer oportunidade. E, quando ficava sóbrio de novo, voltava a ser o baba-ovo extra-oficial do futuro inquilino do cemitério de Sucupira.

Na versão recente de O Bem Amado, em filme, Nezinho infelizmente foi descartado e substituído por Moleza, o sósia de Sérgio Mallandro, cachaceiro e zelador do cemitério. Porém, mais plausivelmente, nessa versão o lado puxa-saco do personagem aparecia quando ele enchia a cara, e no resto do tempo ele era uma “grande ameaça” ao reinado de Odorico. Eles tinham problema mental ou era pura hipocrisia mesmo? Difícil de saber, num vilarejo onde ninguém era o que aparentava.

Há muitas décadas, num tempo longínquo em que o Domingão do Faustão era digerível e as pessoas sequer desconfiavam das armações, eles fizeram uma pegadinha inesquecível. Um repórter abordava um“desavisado” transeunte e lhe perguntava sobre um tema, na época, polêmico, como homossexualidade, mulher de idade com caras mais novos e tal. Enquanto a pessoa respondia, no outro lado da rua dois atores personificavam o tema da maneira mais caricata e exagerada possível. O objetivo da pegadinha era ver se a reação do entrevistado diante da cena condizia com suas palavras. Nem é preciso dizer que ninguém passou nos testes... Hoje há no ar diversas imitações e ramificações dessa idéia, inclusive uma em que o repórter do CQC deixou o filho de Renan Calheiros com o oritimbó na mão ao lançar uma indireta contra o pai dele, mas o original é sempre o melhor.

O assunto da semana que passou foi a visita do porta-voz de Deus na Terra, Papa Chiquito. Pela primeira vez os brasileiros conseguiram cair de amores por um argentino. Piadas à parte, ele parece ser tudo o que seu antecessor, Vossa Emérita Santidade Bento XVI, não conseguia ser: humilde, bom ouvinte e simpático. Aquele sorriso medonho e levemente cínico de Ratzinger foi varrido pra debaixo do santo tapete e substituído por um constante, caloroso e aparentemente sincero exibir de pérolas da parte de Don Jorgito.

Não sei de vocês, mas desde que vi a primeira capa da Veja com o rosto do novo papa, não consigo deixar de imaginá-lo usando o capuz do Batman. Ele pode até se mostrar mais amistoso que seu antecessor, mas depois de uma semana comendo feijoada e conhecendo clássicos de nosso folclore como a Dança da Garrafa e Plaque de 100, seu farto e puro sorriso passou a apresentar ares de desconforto e malevolência, como um jacaré tentando esconder as presas. Após tão longas e entusiasmadas apresentações, será que Papa Chiquito está a ponto de mostrar ao mundo sua verdadeira personalidade?

Claro que Frankie estava ciente que o ambiente no país esteve barra- pesada no mês passado, com os jovens saindo às ruas para protestar contra o status quo governamental, Dilma, seus asseclas e adversários políticos. Mesmo que eles soubessem que Chiquito não tinha vindo passar a mão na cabeça de ninguém, não podiam perder a chance de ser fotografados apertando a mão dele. Um festival de cumprimentos e sorrisos amarelos de ambas as partes, especialmente da presidente, que bancava a boa anfitriã e sorria quase tanto como ele, apesar de já ter atacado diversas vezes a Igreja Católica e estar a ponto de aprovar uma lei permitindo o aborto apenas em casos de vítima de estupro.

Parece que, já que não há solução nem pra política nem pro povo brasileiro, pelo menos a gente tem se garantido quanto à realização de eventos megalomaníacos. Podiam inclusive nos dar ordem de evacuação da área e transformar o país num imenso galpão de festas. Toda essa Jornada Mundial da Juventude, que ao seu final colocou 3.000.000 de fieis na praia de Copacabana- com um único banheirinho químico pra todo mundo... - não deixa de ser uma ode à hipocrisia. Don Jorgito, sendo o jesuíta e seguidor de São Francisco de Assis que diz ser, sequer devia ter concordado em descer do avião se soubesse o quão distante dos ensinamentos de seu ídolo essa festa seria.

Para ele, só um tamborete de pau na beira do mar e um megafone deviam bastar para pregar as palavras de Nosso Senhor. Na verdade, se ele fosse mesmo discípulo de São Francisco, teria vendido suas vestes- que, apesar de simples e menos carnavalescas que as de Bento XVI, não deixam de custar centenas de milhares de euros- e dado o dinheiro aos pobres. Mas nem vimos o Santo Padre dar uma mísera moedinha de 5 centavos pros mendigos, só sorriso e sermão.

Incoerência, a gente se liga em você!



Um comentário:

  1. As palavras são mais eficazes que moedas. O povo brasileiro está mobilizado e a vinda do Papa poderá inserir boa-vontade na população. Eu acredito que foi uma visita de boas consequências.

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