terça-feira, 21 de maio de 2013


No tempo das maxambombas

* Por Leonardo Dantas Silva

Naquela tarde de cinco de janeiro de 1867, o inusitado ocorreu no Recife... Como já haviam noticiado os jornais, nas ruas da pacata cidade de pouco mais de 116 mil habitantes, passou a circular o primeiro trem urbano da América do Sul; uma espécie dos atuais metrôs de superfície que por muitos anos tornou-se o meio de transporte preferido da maioria dos habitantes do Recife e de Olinda.

Explorados pela Brazilian Street Railway Company, empresa dirigida por ingleses, os trens urbanos receberam o apelido de maxambomba e logo uniram o centro do Recife à povoação de Apipucos, estabelecendo assim a “Linha Principal”; que ao chegar na Estação do Entroncamento (hoje praça do mesmo nome), se bifurcava em três ramais: Linha Principal (Dois Irmãos), Caxangá (Várzea e Caxangá), Arraial (Casa Amarela e Monteiro).

Haviam ainda os ramais com destino a Olinda e Beberibe, que tinha seu itinerário através da atual Avenida João de Barro, se bifurcando na Encruzilhada de Belém, com as composições seguindo pela Estrada de Belém (Olinda) e Estrada de Beberibe (hoje avenida). A primeira linha da maxambomba, entre o bairro portuário e a povoação de Apipucos, foi inaugurada em 5/1/1867, com bitola de 1.219 mm (4 pés), sendo nesse ano estendida ao bairro Dois Irmãos e em 24/6/1870 a Caxangá. Um ramal para Arraial (Casa Amarela) começou a funcionar em 24/12/1871.

O vocábulo, segundo Pereira da Costa, “tem origem fluminense, em cujo estado há uma localidade [hoje Nova Iguaçu] assim chamada”; na antiga Lourenço Marques (hoje Maputo), capital da República de Moçambique, na África Austral, o vocábulo servia para designar certo tido de transporte coletivo (espécie de micro-ônibus); opinando Antenor Nascentes ter ele origem na corruptela de machine pump (bomba mecânica). Por sua sonoridade, logo ganhou o folclore sendo cantado nos sambas de então:

Moça nenhuma
Me faça tromba
Qu’eu as embarco
Na maxambomba!

O preço da passagem na maxambomba era fixado em 200 réis por cada milha do trajeto e logo foram inaugurados os ramais de Dois Irmãos e Caxangá (1870), Olinda (1870) e Arraial (1871). Com a construção da ponte Lasserre (ponte da Capunga), no final da atual Rua Joaquim Nabuco, as composições da maxambomba cruzaram a Estrada Nova de Caxangá (atual Avenida Caxangá) e atingiram à povoação da Várzea (1885). Outra linha, com bitola de 1,4 metro, foi instalada por uma nova companhia formada por acionistas locais, a Trilhos Urbanos do Recife – Olinda e Beberibe, fazendo uso de locomotivas inglesas da Manning Wardle e carros de passageiros fabricados por John Stephenson, em New York. A ligação com Olinda, porém, só veio a ser inaugurada em 20 de junho de 1870, fazendo o trajeto através da Estrada de João de Barros passando pela Encruzilhada, seguindo pela Estrada de Belém até atingir Salgadinho, Duarte Coelho e o Carmo.

Na mesma época, foi construído outro ramal que, bifurcando na Encruzilhada de Belém, seguia em direção à povoação de Beberibe, passando pelo Arruda, Água Fria, Porto da Madeira e outras localidades. Neste mesmo ano de 1870, segundo o relatório da concessionária, o sistema de transportes era composto por cinco locomotivas, onze carros de passageiros e cinco eram destinados aos serviços de carga.

No recordar do escritor Mário Sette, “cada um de que viveu seu tempo [da maxambomba] guardará uma recordação amável, esquecendo a poeira dos vagões, o sacolejo das rodas, as janelas sem vidraças, os atrasos nos desvios, os argueiros de carvão e os pregos dos bancos que furavam as calças novas... Olhamos, de longe, somente o lado bom das maxambombas. Sem cometer o gesto ingrato daqueles que recitavam os versinhos em voga antigamente:

Trepei na bomba
Comi pitomba;
Atirei caroço
Na maxambomba...

A maxambomba, tão integrada à paisagem e ao folclore do Recife, funcionou até 1917 quando a Pernambuco Tramways, adquirindo a “Linha Principal”, consolidou um novo tempo: o tempo do bonde elétrico.

        · Jornalista e escritor do Recife/PE

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