quarta-feira, 22 de maio de 2013


Malditas geladeiras!

* Por Fernando Yanmar Narciso

Em 2008, Steven Spielberg, George Lucas e Harrison Ford uniram forças novamente para dar vida a uma das sequências mais desnecessárias e infames da história de Hollywood: Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal. Apesar da tentativa de trazer de volta os velhos tempos, os fãs não perdoaram o excesso de confiança na computação gráfica- coisa que a série nunca teve ou precisou, o roteiro que constantemente desafiava a barreira entre a forçada de barra e a insanidade e, especialmente, não perdoaram uma cena que, de tão absurda, foi imortalizada nos anais da cultura popular como o exato momento em que essa barreira foi rompida.

Em tal cena, Jones se encontrava encurralado por bandidos num sítio de simulação de ataques nucleares, completo com manequins e uma cidade cenográfica. Desesperado e contando com poucos segundos para se safar, o herói tem a ideia de jerico de se esconder dentro de uma geladeira para se proteger da radiação. E assim que a bomba é detonada e o sítio é evaporado junto com os bandidos, lá vem a geladeira salvadora, voando por cima da explosão e quicando violentamente no chão várias vezes! Se o filme tivesse acabado ali, Jones teria morrido como um herói. Mas para a incredulidade geral da nação, Indy, vivinho da silva e só levemente chamuscado, rola para fora de seu escudo gélido e assiste de longe ao enorme cogumelo atômico subindo aos céus. Essa cena causou tanta revolta de fãs e cientistas que, em sua homenagem, foi cunhada a expressão “explodindo a geladeira”, que passou a simbolizar o momento em que um filme ou programa de TV, desesperado por novidades, resolve dar uma banana pra tudo o que vinha sendo construído até então e lança uma maluquice sem tamanho, só pra ver se a audiência engole. Se ao menos Gloria Perez tivesse conhecimento de tal expressão...

Já faz quase um ano que a petárdica Avenida Plasil terminou, os rábicos fãs daquela novela já se acalmaram, mesmo que ainda não dê para deixar de compará-la à agora finada- Salve Jorge. O sucesso da trama de JEC foi tão grande que até eu teria problemas para assumir seu lugar. Mas, sejamos justos, pessoal. Apesar da constante ambientação de filme de terror, de ter duas personagens principais incríveis se engalfinhando por sete meses e da inesquecível e imatura Carminha, o que aprendemos de bom assistindo aquilo? Qual foi o grande acontecimento que amarrou todos os núcleos da história? Basicamente, só ocorreu um plano retardado de autossequestro da vilã, para tentar extorquir ainda mais o Tufão, e a apavorante morte de Max, eterno comparsa de Carminha, e que no final era o verdadeiro cara mau da dupla.

Tirando isso, Avenida foi o Seinfeld das novelas. Essencialmente, não aconteceu nada de mais em toda sua duração, tirando a vingancinha de Nina contra sua estereotipadíssima madrasta, os demais personagens ficavam simplesmente orbitando ao redor da mansão. E devoramos aquilo como urubus atacando carniça. No último capítulo teve até gente nos bares se ajoelhando e dando as mãos como nos Alcoólicos Anônimos! Deu no Globo Repórter Especial!

Por outro lado, Salve Jorge foi um fracasso monumental de audiência mesmo tendo inovações, bons conceitos e o sempre presente marketing social de Gloria Perez, alertando as pessoas sobre o tráfico humano. Entretanto, a chuva de geladeiras explodindo não soube a hora de parar. Não que Avenida também não tenha tido seus momentos risíveis de “explosão de geladeira”, mas os devaneios da novela rival foram tantos e tão persistentes que o artigo renderia umas 30 páginas se me dedicasse exclusivamente a eles, então vou me limitar só aos problemas que, creio, foram consenso geral.

Em primeiro lugar, o casal protagonista. Uma regra que nem mesmo a mestra Janete Clair ousaria subverter é não colocar dois personagens bondosos para disputar uma paixão. Precisa sempre ter um amado gente boa e um amado sacana para gerar a torcida, e esse clichê parece ter caído em desuso ultimamente. O casal “Mo-Théo” foi insosso porque, tirando a história dela ser traficada e prostituída, ela não precisou disputá-lo com ninguém e nem vice-versa. Desde o início a gente sabia que a coitada da Érica não ia dar nem pra saída contra Morena, era só a eterna namoradinha-estepe do garanhão. Quantos de nós não torcíamos para que Morena conhecesse um par perfeito de verdade na Turquia e esquecesse o príncipe falsificado? Claro que o fato de Rodrigo Lombardi ser mais canastrão que o Stallone contribuía um bocado com o repúdio ao personagem. E a história de Livia Marini, a grande vilã e rainha da seringada, se apaixonar pelo mocinho e fazer cara de derrame toda vez que ele passava? ÓIA A GELADEIRA! Ver os dois na cama foi como ver o Coringa transando com o Batman.

E as oportunidades que Gloria Perez insistentemente desperdiçou em toda a trama? Tenho certeza que a frase mais berrada no Brasil na última sexta-feira foi ATIRA LOGO! Nem em faroestes da década de 40 já vi tanta gente apontando armas umas para as outras sem puxar o gatilho. Já era o último capítulo da novela, até que valeria a pena matar um herói ou um vilão. Já pensaram se Morena tivesse estourado os miolos de Lívia Marini na cena final, ou o contrário? Estaríamos falando do último capítulo até hoje. Infelizmente, Tia Glorinha não é nenhum Hitchcock...

Pelo menos tivemos direito a um ótimo momento onde Morena, aprendiz de Capitão Nascimento, encurralou Wanda tentando escapar por um bueiro à la Tartaruga Ninja e a rendeu atirando nos pés dela para fazê-la sapatear, tal qual Lucky Luke fazia com os Daltons. Cena hilária e satisfatória, sem deixar de ser embaraçosa. Tia Glorinha pode até ter explodido várias geladeiras esse ano, mas assistir a uma geladeira sendo alvejada por uma explosão nuclear e voando para fora da tela com certeza seria mais emocionante que ver Morena e PasThéo se beijando ao som do Rei Roberto.


Um comentário:

  1. Crítica irónica e por isso mesmo engraçada do capítulo final de Salve Jorge. A novela se salvou? Parece que sim, e cá estamos nós nos divertindo com sua análise.

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