quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

Liberdade, ainda que tardia!

* Por Mara Narciso

Após a busca da felicidade, o que se quer é liberdade. Muitos a procuram, e nem sempre sabem onde encontrá-la. Algumas revoluções têm a liberdade como palavra de ordem, como aquela da Inconfidência Mineira, em latim, “Libertas quae será tamen”, cuja tradução é o nome deste texto, ou o lema da Revolução Francesa (1789) que era Liberté, Égalité, Fraternité, ou, Liberdade, Igualdade, Fraternidade.

Quando se é criança, se anseia por liberdade, mas a necessidade de obedecer é maior. Então chega a juventude, e a vontade de ser livre se amplia. É quando eclodem os maiores conflitos, e se ouve: “quem come do meu feijão, aguenta meu ‘currião’”. Estranho? É o aumentativo/corruptela de correia ou cinto.

Uma mulher grávida, por exemplo, sente-se presa, e quer que chegue logo o dia do parto para “descansar”. Caso seja o primeiro filho, mal sabe ela que aí começa o cansaço. Ainda que seja com muita alegria. Sacudindo o filho no colo, mal vê a hora de não ter de segurá-lo nos braços, e anseia pelo momento em que o filho andará. O que triplica o trabalho. Ter um filho é como estar peada, com os dois pés amarrados. Não se pode fazer nada. Ainda assim, quase todas querem ser mães, e quando não querem, no seu sagrado direito de escolher, são vistas como egoístas.

O casamento também é tido como prisão, então, entre casais, a liberdade é a possibilidade de fazer o que se quiser. Alguns defendem o relacionamento aberto em que a ideia, aceita por poucos, pois o ser humano é possessivo e ciumento em sua natureza, é a liberdade total. Para ilustrar, uns versos da música “Já sei namorar”, dos Tribalistas: “Eu sou de ninguém/ Eu sou de todo mundo/ E todo mundo é meu também”.

Filhos pequenos segurando de um lado e pais idosos do outro. Os velhos estão sendo abandonados em nome da liberdade. Dos seus filhos, é claro. A desculpa é: “todo mundo aqui trabalha, e ninguém tem tempo para cuidar de mamãe”. Dessa forma, aonde chegará a nossa civilização?

Quem viveu 21 anos sob o comando da Ditadura Militar, quando censores escolhiam o que se via e se ouvia, até desenhos de Tom e Jerry eram cortados, e partes de corpos com pouca roupa borrados, cargos políticos eram escolhidos por um grupinho. Em 1976, Sérgio Mineiro e Beto Ruschel fizeram os versos “Liberdade é uma calça velha / Azul e desbotada / Que você pode usar / Do jeito que quiser”, e foram criticados. A juventude engajada achou a letra da propaganda da calça US TOP alienante. Nos dias atuais votar deveria ser o grande momento da liberdade. Mas não tem se mostrado como o clímax da democracia. Há elevada abstenção, milhões de votos brancos e nulos, pessoas que votam e não se lembram em quem votaram, e políticos que envergonham a população, fazendo o exercício do voto um momento desconfortável.

A falta de tempo é o cárcere atual, com o relógio no comando. Arruma-se uma agenda de 26 horas para cada dia, e se enforca na pressa. Tantas desimportâncias elevadas a prioridades, desde a caixa de e-mails até o que acontece no Facebook ou no Big Brother, amarrando pessoas a obrigações que torturam e esvaziam. Há quem pense que escolhe um aparente hábito, mas na verdade foi capturado pelo vício.

E o trabalho que não causa prazer? Há a possibilidade de mudar de ramo, de diminuir a agenda, de negociar com o chefe. Trabalhar um pouco menos pode ser mais rendoso do que ficar tantas horas no trabalho. Pergunte-se: a que horas vou viver? O lazer é investimento. O que foi alcançado pelo trabalho precisa ser aproveitado. Usufruir passo a passo, ano a ano é tão importante quanto conquistar.

Cuidado! Ter não é o mesmo que possuir. Empréstimos consignados e contas para pagar em 60 meses parecem ser, mas não são um bom negócio. Afinal, melhor mesmo é poder sair quando se quiser, para viajar, ou apenas caminhar. Ser livre pode ser poder ver, como em “Liberdade para as borboletas”, filme de 1972, em que um rapaz deficiente visual sai de casa e vai morar sozinho, enfrentando um desafio perturbador.

Parece contraditório, mas quem quiser andar livre, leve e solto, em completa liberdade, precisa seguir as leis. Não é preciso viver todos os desastres para saber o que não é bom. Ter liberdade é um bem que não tem preço.


*Médica endocrinologista, jornalista profissional, membro da Academia Feminina de Letras de Montes Claros e autora do livro “Segurando a Hiperatividade” – blog http://www.teclai.com.br/

3 comentários:

  1. Gostei muito, Mara. Precisamos de sabedoria a fim de sermos felizmente livres. Abraço!

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    1. Verdade, Sayonara. A liberdade inconsequente é pior do que a prisão. É preciso saber ser livre. Obrigada pelo comentário.

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  2. Excelente, Mara. Liberdade é sempre relativa, e exige bom senso para que seja plenamente usufruída. Parabéns e um grande abraço.

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