quinta-feira, 21 de junho de 2012

Tarde demais 18


* Por Gustavo do Carmo

Foi chamado para trabalhar na afiliada da maior emissora de televisão do Brasil. O diretor de jornalismo ligou pra ele e marcou uma entrevista para o dia seguinte. Confiante, Orlando teve que se deslocar de Teresópolis até Nova Friburgo, em uma desconfortável viagem de uma hora e meia de ônibus.

Chegou com meia hora de antecedência. Foi recebido por Guilherme, repórter da emissora, com quem estudara na faculdade. Este levou o antigo colega até uma mesa com computador e apenas disse:

— Trabalha aí!

E Orlando trabalhou. Trabalhou por duas horas até o almoço. Como produtor, “vendeu” duas pautas para o jornal da tarde. Uma virou reportagem, mas ele não ganhou crédito. A outra foi derrubada por uma notícia de última hora. Depois do intervalo, trabalhou mais quatro horas. No segundo turno, não “vendeu” nenhuma pauta.

Ao final do expediente foi recebido pelo diretor de jornalismo no escritório dele. Luiz elogiou o trabalho do candidato e quase garantiu a contratação nas próximas semanas. Mas impôs uma condição, quase ridícula: que ele tirasse o registro do sindicato estadual de jornalismo.

Obviamente, Orlando aceitou a condição. Foi gentilmente acompanhado até a rodoviária por Luiz, que disse ter adorado o seu trabalho e garantiu contratá-lo tão logo ele obtivesse o tal registro.

No dia seguinte, já foi à sua faculdade para dar entrada no diploma, que só conseguiu no mês seguinte. Desde então, Orlando continuou desempregado, à espera de um contato de Luiz para um novo período de testes.

Trinta dias depois do teste em Nova Friburgo, com o diploma na mão, Orlando enfrentou uma viagem de três horas até Niterói para se registrar no sindicato estadual. O atendimento foi rápido, mas ele enfrentou seis horas para voltar a Teresópolis, pois enfrentou um engarrafamento monstro na estrada São Gonçalo-Magé e depois um acidente na serra.

Depois de três meses o registro saiu. Orlando já não precisava mais dele. Soubera há um mês que a sua vaga na emissora local de TV fora preenchida por uma amiga da filha de Luiz. Orlando desistiu do jornalismo e virou historiador. O jornalismo lhe deu uma triste história.

* Jornalista e publicitário de formação e escritor de coração. Publicou o romance “Notícias que Marcam” pela Giz Editorial (de São Paulo-SP) e a coletânea “Indecisos - Entre outros contos” pela Editora Multifoco/Selo Redondezas - RJ. Seu blog, “Tudo cultural” - www.tudocultural.blogspot.com é bastante freqüentado por leitores

2 comentários:

  1. Doloroso final com gostinho de pouco caso, ainda
    bem que ele se refez, afinal de contas decepções
    não matam, apenas adiam.
    Abração Gustavo.

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  2. Desanimou com muito pouco. Até elogios tinha recebido. Afora o final, achei a história bem verossímil.

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