sexta-feira, 29 de junho de 2012

Potencial Caixa de Pandora

A Engenharia Genética, ou seja, a tentativa humana de interferir nos genes de seres vivos para “corrigir” o que a natureza levou milhões, quiçá bilhões de anos para fazer e torná-los, dessa forma, supostamente mais úteis ao homem, por sua produtividade, é um campo relativamente novo. Mas... não tão novo assim. Muito antes dos cientistas da Universidade do México terem desenvolvido suas “microvacas”, já existiam, por exemplo, há tempos, os minipôneis da Argentina. Estas e outras tantas experiências, com animais ou com plantas, geraram, geram e certamente ainda irão gerar muitas polêmicas, se não sobressaltos. Há defensores, há os que as combatem e há, principalmente, os indiferentes e desinformados a propósito (a imensa maioria).

Em 1971, a revista “Enciclopédia”, editada pela Editora Bloch, estampou reportagem a respeito das mudanças genéticas em animais para a produção ora de cavalos e vacas “anões”, ora de “gigantes”, ambos fora, portanto, dos padrões naturais. A matéria foi publicada no número de julho da referida publicação. Foi feita na fazenda El Peludo, de propriedade de Júlio César Falabella, que guardava o segredo dos minipôneis a sete chaves. Dezesseis anos após, em setembro de 1987, a revista Cláudia, da Editora Abril, trouxe matéria parecida, desta vez abordando um produtor desse minúsculo animal no Brasil, na estância “Morada dos Pôneis” em Viamão, a pouco mais de 20 quilômetros de Porto Alegre, região metropolitana da capital gaúcha. O criador brasileiro era o fazendeiro Sérgio Feolli.

No caso argentino, os minipôneis foram desenvolvidos pelo veterinário Domingos Canter, ex-professor da Faculdade de Veterinária de Buenos Aires e engenheiro-agrônomo. Pelo valor comercial dos animais, o pesquisador preferiu guardar segredo quanto ao método empregado. Assegurou, todavia, que o processo envolveu muita paciência e grande dose de acaso. Não implicou, por outro lado, como garantiu, na utilização de drogas de quaisquer espécie.

Conclui-se, das afirmações de Canter, que o início de tudo foi espontâneo. Ou seja, ocorreu o nascimento, na fazenda, de alguns cavalos de pequeno porte, por causa de uma mutação genética não induzida. A partir daí, o veterinário começou a manipular os genes desses potros protótipos, tentando tornar seus descendentes cada vez menores. Na Inglaterra, há tempos, pesquisadores vinham trabalhando no desenvolvimento de cavalos de pequeno porte. Após várias tentativas frustradas, conseguiram produzir “monstrinhos”, ou seja, animais com cabeça e corpo normais, mas com as extremidades (patas) mais curtas. Chamaram-nos de “anões condrodistróficos”.

Com os minipôneis de Canter, porém, não aconteceu assim. Foram gerados cavalos perfeitamente proporcionais, posto que muito pequenos. Os maiores, pesavam entre 40 e 50 quilos e mediam de 60 centímetros a um metro. O menor conseguido tinha o peso de sete quilos e 18 centímetros de altura. Mas todos eram miniaturas absolutamente perfeitas. Para os que argumentam que as experiências são uma crueldade, que trazem sofrimentos aos animais, o veterinário rebateu, citando sua longevidade. Os minipôneis vivem, em média, 50 anos, quase o tanto que um homem (no Terceiro Mundo há pessoas cuja expectativa de vida não chega sequer aos 40 anos). Os cavalos normais, por seu turno, vivem, em geral, metade desse tempo ou um pouco menos, de 20 a 25 anos, e isso quando são muito bem tratados.

No outro extremo das experiências estavam animais gigantes, também desenvolvidos por Canter, excelentes para tração, com excepcional rendimento de trabalho. Mediam 2,8 metros e pesavam mais de uma tonelada, ou um mil e duzentos quilos, em média. Mas os minipôneis, de acordo com seus “criadores”, não valem apenas como atrações, para saciar a curiosidade. Há alguns, segundo eles, de muita utilidade para o trabalho. São tão bons para trabalhar, argumentam, como os gigantescos “percherões” (da região francesa de Perchere). Mas têm a vantagem de comer menos e de viver mais. Pesam somente 40 quilos, contra os 800 da raça criada na França. Por isso, os minipôneis têm sido disputados para trabalhar em minas, especialmente no Chile e no Peru.

Nos Estados Unidos, a equipe do doutor Dale Bauman, da Universidade de Cornel, pesquisou, desde o início da década de 70, um hormônio para acelerar o crescimento das vacas e aumentar sua produtividade em 40%. Trata-se de uma proteína conhecida como somatropina, réplica exata de uma substância que o animal produz naturalmente em seu processo de desenvolvimento. Todavia, esse gigantismo não implica no aumento de peso. Não se está produzindo um espécime bovino de cinco toneladas, por exemplo. Como ocorre no caso dos minipôneis, a supervaca não é monstruosa ou aberrativa. Guarda absoluta proporcionalidade em todo o corpo.

Baume tomou, como ponto de partida para seu trabalho, pesquisas feitas na Grã-Bretanha durante a Segunda Guerra Mundial. Na oportunidade, os pesquisadores buscavam aumentar a produção de leite mediante injeções de extrato de pituitária. Entretanto, esbarraram em um grave problema, de caráter econômico, que inviabilizava todo o projeto. Para se obter a substância a ser injetada, era preciso sacrificar até cem cabeças de gado, das quais o hormônio era extraído.

Baume, porém, adotou outro método com a somatropina. Em entrevista que concedeu à agência de notícias norte-americana The Associated Press, na oportunidade, o professor de Cornel assinalou: “Na realidade, a substância permite às vacas usar proteínas que de outra maneira produziriam graxa, para ter leite”. Em outras palavras, o hormônio injetado faz com que o animal ganhe em eficiência. As pesquisas no campo da Engenharia Genética, no entanto, têm despertado reações negativas nos mais diversos círculos. Alguns cientistas entendem que essas experiências com animais vivos são prematuras. Os defensores dos animais, por seu turno, acham que os estudos são uma forma de crueldade contra seres irracionais sem condições de reclamar ou de reagir, com o que concordo plenamente.

Amedronta-me, sobretudo, o fato de pessoas quererem brincar de deuses para interferir na obra da natureza. Sempre que isso acontece, salvo raríssimas exceções, os resultados tendem a ser desastrosos, quando não catastróficos. Um dos meus maiores temores atuais, por exemplo, refere-se aos chamados “transgênicos”, ou seja, plantas geneticamente modificadas para resistirem às várias pragas, poupando aos agricultores a utilização de vários defensivos agrícolas, como herbicidas e germicidas. Boa parte dos grãos plantados mundo afora (soja, milho, feijão etc.) já tem essa característica.

Aparentemente, os transgênicos não são nocivos ao homem. Mas não são mesmo? E se, a longo prazo, eles se revelarem indutores (ou aceleradores) de doenças? A tendência, pelo que se observa, é de em algumas décadas não existirem mais sementes originais, mas apenas as geneticamente modificadas. Caso estas se mostrem nocivas – não raro essa nocividade demanda tempo para se manifestar, ou para ser devidamente detectada e identificada – corre-se o risco da humanidade ficar privada, e para sempre, dessas tradicionais fontes de alimento que a alimentaram por séculos, por milênios, por sabe-se lá desde quando. Seria uma catástrofe de conseqüências terríveis.

Os pesquisadores asseguram que não há esse risco. Será que não há?!! Na qualidade de leigo, mas que tem a faculdade de pensar e que a exerce plenamente, não tenho tanta certeza assim. Aliás, não tenho nenhuma!!! Você tem, amável leitor? Se tiver, ela se baseia no quê? Na mera palavra de quem (e não importa o motivo) resolveu “brincar de Deus”, se arrogando em reformador da natureza? Ora, ora, ora.

Não é sequer necessário que se lembre os números trágicos da miséria que campeia no Planeta, em especial no chamado Terceiro Mundo. A utilização de técnicas de Engenharia Genética, para produzir melhores e mais alimentos e, sobretudo mais baratos, se funcionar, não deve ser questão meramente econômica, mas humanitária e, portanto, moral. Mas... e se não funcionar? Em vez de se resolver um problema, será criado outro infinitamente maior. Vale a pena correr o risco ou é preferível “conservar o pássaro que se tem nas mãos a tentar capturar o bando que está voando”? O que você acha?

O ex-primeiro-ministro britânico, Winston Churchill, em histórico discurso que fez no Saint Andrew’s Hall, em Glasgow, na Escócia, observou: “Tenho esperanças no estabelecimento universal de padrões mínimos de vida e de trabalho. Devemos traçar uma linha abaixo da qual não consentiremos que as pessoas vivam e trabalhem, mas acima da qual possam competir com toda a força da sua virilidade”.

Mas cerca de três quintos da humanidade estão na parte inferior dessa escala. Como corrigir isso? É uma questão sobre a qual vale a pena não somente pensar, mas, sobretudo, agir, para corrigir tamanha distorção, se é que ainda tem correção. Temo, todavia, quando o homem, inadvertidamente, em nome da ciência, da solidariedade, ou seja lá do que for, tenta abrir esta que pode ser insidiosa “Caixa de Pandora”, que contenha males muito maiores e piores do que os que grassam há tanto tempo pela Terra.

Boa leitura.

O Editor.

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2 comentários:

  1. Não vejo com bons olhos essas experiências, julguem-me simplória, como queiram, no meu
    entender todas as coisas criadas são perfeitas
    sujeitas a alteração apenas da natureza que de tempos em tempos faz sua seleção natural.
    Abraços

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  2. Li matérias não especializadas de que os transgênicos não oferecem riscos aos humanos, que aumentam a produtividade, são resistentes a pragas e evitam o uso de agrotóxicos. Acreditei em parte e espero que estejam certos, pois há muito tempo usamos produtos industrializados com soja transgênica e nem nos demos conta disso. Outro aspecto que imagino é a deterioração dessa mutação genética levando a perda da qualidade dos produtos gerados. Por exemplo, espigas de milho que após seguidas plantações, não mais produzam grãos. Sou leiga, mas já vi coisas desse tipo.

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