sexta-feira, 20 de abril de 2012



Direitos sonegados

O mercado editorial, felizmente, traz opções para todos os gostos e necessidades. É verdade que, no Brasil, o livro ainda é relativamente muito caro para nosso padrão de renda. Se há algo que mereça ser subsidiado e contar com todas as facilidades possíveis e imagináveis, para ampla difusão, é este formador de consciência, imprescindível em uma sociedade que se pretenda minimamente civilizada. /O brasileiro precisa, mais do que nunca, ler, ler e ler. Afinal, como todos admitem, pelo menos da boca para fora, “um país se faz com homens e livros”. Caros ou não, contudo, há opções de todos os tipos e para todos os gostos.

Há, por exemplo, obras literárias que se limitam a ser fontes de lazer, com histórias as mais variadas, de amor, de aventuras, de suspense etc., para distrair-nos em nossos momentos de descanso. Não há melhor diversão do que essa, creiam-me. Quem tem esse saudável hábito da leitura, certamente concorda comigo. Quem não tem... Não sabe o que está perdendo. Há, ainda, livros que suscitam e induzem à reflexão, que nos enriquecem espiritualmente e complementam nossa formação humanística. E há, por fim, os que se destinam a alertar as pessoas para graves problemas sociais e/ou comportamentais, que requerem soluções imediatas e que, entre outras coisas, provocam polêmicas, o que é saudável e necessário para a conscientização da sociedade.

É nessa categoria que situo o livro “Criança indígena – Olhar Multidisciplinar”, publicação da Editora Alvorada, obra coletiva lançada, ontem (Dia Nacional do Índio), no Auditório Germano de Barros, do Centro de Convenções Rubens Gil de Camilo, em Campo Grande, capital do Estado de Mato Grosso do Sul, lançamento este sucedido por um ciclo de debates, que se estende pelo dia de hoje, com a participação de ilustres especialistas das mais diversas áreas e de não menos ilustres convidados. O evento conta com a coordenação da procuradora da Justiça e ex-promotora de Justiça da Infância e Juventude, Dra. Ariadne Cantu.

O prefácio foi redigido pela ex-ministra do Meio Ambiente do governo do presidente Luís Inácio Lula da Silva, candidata à Presidência da República nas eleições passadas, Marina Silva. Paula Rogério Gomes Santos organizou os textos, além de redigir um deles. Os outros autores são, pela ordem: Adir Casaro Nascimento, Ana Keila Mosca Pinezi, Antonio Hilário Aguilera Urquiza, Elcio Felix D’Angelo, Eli Ticuna, Luizx Eduardo Canto Bueno, Murilo Di Giácomo, Renzo Siufi, Ronaldo Lidorio, Rubens Trombini Garcia, Samir Roger Jordy Barrieri, Sônia Grobits, Vital do Rego Filho e Willian Lira de Souza.

O livro traz a público a atual situação de crianças e adolescentes indígenas, no mínimo dramáticas, para não dizer desesperadoras, reconhecendo seus direitos que precisam ser garantidos, mas que, infelizmente, não são. O objetivo, tanto da obra, meticulosa e detalhada, quanto do ciclo de debates, altamente esclarecedor, é o de fomentar, diante da gravidade da situação, o avanço de idéias, perspectivas e soluções para esses problemas. Reconheça-se que, infelizmente, é tarefa digna do personagem de Miguel de Cervantes, o sonhador Dom Quixote de La Mancha. Note-se que a grande imprensa simplesmente ignorou tanto o lançamento do livro, quanto o ciclo de debates, como se se tratasse de coisa menor.

Trato, porém, do assunto na esperança de obter a adesão de outras vozes, o maior número possível delas, de preferência mais potentes e audíveis do que a minha, como na fábula daquela abelhazinha que, diante de um pavoroso incêndio na floresta, ia e vinha, sem cessar, levando ínfima gota de água em sua boca e despejando-a, pressurosa, no fogo. Questionada a respeito da inutilidade da sua ação, respondeu: “estou fazendo a minha parte, o máximo que posso”. Se todos os outros agissem assim, as chamas seriam prontamente debeladas.

A situação do índio no Brasil é tão grave, que apenas para situá-la, seriam necessários vários textos, muito maiores do que este, tão complexa e desesperadora se apresenta. Recentemente, há somente alguns meses, repercutiu, no mundo todo, e muito mal para a nossa imagem no exterior, o hediondo caso do pequeno indígena, de apenas oito anos de idade, queimado vivo por madeireiros, em uma reserva do Mato Grosso do Sul. E este não é um caso isolado. É apenas mais um dos tantos que acontecem com desoladora frequência e dos quais sequer suspeitamos ou tomamos conhecimento. Como sempre acontece, a notícia não mereceu a menor atenção da imprensa nacional, como se fosse normal se queimar uma criança, não importa de que etnia, e não uma horrenda brutalidade, cujos autores precisassem ser segregados do convívio social.

Comentando sobre o lançamento do livro (que coordenou) e sobre o ciclo de debates de que participou ativamente, a ilustre jurista (e também magnífica escritora) Dr. Ariadne Cantu acentuou: “Considero como uma gota num oceano, uma contribuição ao reconhecimento de nossas responsabilidades, que solidárias, se propagam em diversos setores dentro de um contexto multidisciplinar. As crianças indígenas não são invisíveis. Olhem por elas!”. Fazendo isso, é mister ressaltar, não se estará fazendo nenhum favor aos índios. Apenas se estará garantindo um direito inalienável, que lhe é assegurado pela Constituição, que vem sendo sistematicamente violado, e há muito tempo.

Boa leitura.

O Editor.

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Um comentário:

  1. Um murro no estômago de todos, nós, quando no Dia do Índio pessoas discutiam no Facebook sobre a existência ou não de índios no Brasil.

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