sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012







Segunda opção nunca mais!!!!!

* Por Eduardo Oliveira Freire

Meu Deus, por que eles fizeram isso comigo? Eu os adoro tanto, até mais que a minha própria vida e família. Desgraçados, vou matá-los. Mas e a minha monografia, tenho que terminá-la logo, para me preparar melhor no mestrado do período que vem. Filhos da puta”.

Ronaldo estava na Kombi. Pegava esse mesmo transporte para ir ao estágio e à faculdade, que eram muito longe de onde morava. Vivia o dia inteiro fora de casa.

Trabalhava com o professor e orientador de sua monografia. Foi segunda opção. Um outro aluno não aceitou a proposta de estágio, por ter arranjado coisa melhor. Ronaldo era esforçado, fazia de tudo para agradar o professor, mas este nunca o elogiava. Só dizia que seus trabalhos eram fracos e que tinha que melhorar bastante. Sempre mandava Ronaldo refazer tudo de novo.

Ana, a namorada, no início era apaixonada por outro rapaz, só que ele já tinha uma outra. Ronaldo, que sempre gostou dela, consolou-a. Logo, foi à segunda alternativa outra vez. Ele não se importava com esta situação, queria ser feliz. Desde criança vivia a mesma coisa. Era sempre o reserva nas partidas de futebol na rua, onde morava, e até o cachorro, que ganhou de presente de aniversário, primeiro fazia festinha em qualquer um que chagasse com Ronaldo, depois era que brincava com o seu dono.

Um dia, Ronaldo ficou desesperado porque o seu computador havia quebrado. Pediu para usar o de Ana. Ela relutou um pouco, mas vendo o desespero do namorado resolveu deixar, deixando-o sozinho, tinha compromisso. Ronaldo digitava o trabalho, bem concentrado, quando o telefone do quarto de Ana tocou. Estava tão absorto que não prestou atenção. Após alguns toques, a secretária eletrônica atendeu. Uma voz conhecida começou a falar. Essa voz é do meu professor, pensou Ronaldo.

- Ana, você esta aí? Vamos nos encontrar de novo?

“Não acredito!! Meu professor orientador e minha namorada tendo um caso!! Vou matá-los!”. Não quis saber mais de nenhum de trabalho, quis vingança. As pessoas que ele mais admirava estavam de sacanagem com ele:
“Ela é uma ratinha no cio. Ele é um idiota que só vive do passado. Para ele, a década de 70 ainda não passou. Se acha o máximo só porque lutou contra a ditadura, fez orgias sexuais e foi para Cuba, exilado. Mas, isso não quer dizer que seja melhor do que eu, nem a sua geração melhor que a minha!!”.

Traído e revoltado teve um plano, iria matá-los. Passado algumas semanas, seguiu a namorada até o apartamento do professor, gastou tudo que tinha, pediu um empréstimo aos seus pais, que deram muito a contra gosto e roubou a metade do salário da empregada. Tudo isso para subornar o porteiro e entrar no apartamento escondido.

Conseguiu entrar. Foi direto ao armário do quarto esconder-se. Ronaldo ficou admirado com a performance do professor.
“Como ele faz tudo isso? Quero aprender também, que disposição, é mais velho do que eu e tem muita energia!! Ele é inteligente, intelectual e bom de cama, desgraçado!! Tanta perfeição me enoja. Com esta faca que estou segurando, vou acabar com toda essa personificação da perfeição!!”.

Depois do casal fazer quase todas as posições do Kamasutra, Ronaldo, que tudo assistia, se preparava, com a faca na mão, para vingar-se desses “traidores nojentos”. Contudo, o casal de amantes começou a conversar, alguns assuntos triviais, até começarem a falar de Ronaldo. Ele ficou inibido em atacá-los.

- Ronaldo é um cara legal. Gosto dele, apesar de ser um pouco limitado – disse a Ana.

- Está até melhorando na escrita. Mas ainda está muito ruim.

- Eu falo para ele ler mais. Até tenta, mas lê um minuto e já dorme esgotado. Só consegue ler um livro por ano. Eu disse que deveria ler pelo menos seis livros por ano.

- Você não está sendo muito exigente?

- Eu sou assim, não gosto de mediocridade.

- Ele vai conseguir melhorar, para ser uma pessoa tão culta quanto a gente.

- Tomara que sim, outro dia peguei um filme do Bergman e ele simplesmente dormiu, e até babou, molhando todo o meu ombro.

- Puxa, Bergman é divino!

- Mas, ele gosta de filmes do Spielberg e possui uma coleção dos livros do Sidney Sheldon. Fazer o quê, né...

- Não acredito! Precisamos queimar esta coleção para salvar a intelectualidade que está nascendo naquela pobre cabecinha!

- Vamos fazer isso!

Ronaldo ficou apavorado; “Não! Minha coleção de Sidney Sheldon, nem pensar!”. Saiu do armário e disse:

- Sei que vocês gostam de mim. Querem me salvar da alienação e do mau gosto. Posso até permitir que vocês controlem a minha vida, mas não vou deixar que vocês destruam a minha coleção do Sidney Sheldon, herança da minha falecida avó Marinalda.– foi embora.
Ana e o professor ficaram chateados. Não conseguiram iluminar a mente de Ronaldo.

Pela primeira vez quis encontrar o seu caminho, sem interferência de ninguém. Não sabia o que ia fazer, porém desejava ser ele mesmo e não o que os outros diziam para ser. Chegou a sua casa, subiu na laje e gritou bem alto: - SEGUNDA OPÇÃO NUNCA MAIS!!!.

Os vizinhos olharam assustados, achando que Ronaldo ficara louco. Dona Creuza, uma senhora bem idosa disse para uma colega sua: –
Minha filha, esses jovens universitários é tudo maconheiro. Deve ser que o filho da Maria Augusta fumou tanto, que agora tá louquinho da silva.

E assim o dia terminou e uma nova fofoca para se comentar na rua chamada Sossego.

* Eduardo Oliveira Freire é formado em Ciências Sociais pela Universidade Federal Fluminense, com Pós Graduação em Jornalismo Cultural na Estácio de Sá e é aspirante a escritor

Um comentário:

  1. É bom ler contos do dia-a-dia dos jovens. Especialmente na escola. Gostei bastante do enredo, que me pareceu verossímil.

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