sábado, 27 de agosto de 2011



Chuvas de agosto

* Por Clóvis Campêlo

Para nós, recifenses, inverno é sempre sinônimo de chuva. E o Recife, cidade já tão privilegiada no seu convívio com as águas, torna-se ainda mais úmida. Particularmente, nunca gostei desse tempo de chuva, embora o saiba necessário. É tudo frio e úmido ao deitar e tudo frio e úmido ao levantar.
A quem diga que nós, recifenses, na realidade, não sabemos o que seja o frio. Podem ter razão. Mas, para nós, acostumados a uma temperatura média de 26º graus, tudo o que não seja calor será frio. E o frio é a negação do azul intenso da qual a cidade se reveste no verão. É a negação dos nossos verdes mares e da nossa morenidade curtida sob o sol da alta estação. Sob a chuva, no inverno, o Recife perde as suas cores e a sua alegria. Torna-se cinzenta, plúmbea, depressiva.
E eu, que nunca me deixei seduzir pelo sentimento do mundo e me sinto como um coqueiro encravado nas areias mornas da cidade, necessito do sol, do sal, do azul do céu para oxigenar as células e elaborar a fotossíntese da vida. O inverno chuvoso do Recife me deprime.
Este ano, as chuvas começaram cedo, em abril, e ainda não pararam. No calendário da minha infância, vivida na praia do Pina, agosto sempre foi o mês do ventos. Era em agosto que a chuvas começavam a declinar, levadas pelos ventos intensos do mês. Era o período de empinar papagaios e pipas nas areias ainda úmidas da praia, aguardando a chegada do verão em setembro. Naquele tempo, agosto era o mês da transição, que ainda sofria com o desbotamento invernoso. Agosto ia se colorindo aos poucos.
E quando setembro chegava, retornavam a alegria, todas as cores, todas as vozes, todos os movimentos. Restaurava-se definitivamente o verão, o calor. Setembro nos trazia a praia e a vida de volta.
Hoje, agosto ainda é chuva e falta de cores. Dizem que isso se deve ao aquecimento das águas do Oceano Atlântico, ao fenômeno do El Niño. Podem ter razão. Afinal, tudo muda ao longo do tempo e que sou eu para duvidar da sabedoria dos homens da ciência.
Dou-me ao direito, porém, como criança que fui, de discordar desse menino levado que teima em jogar para os céus as águas salgadas do oceano e fazer com que as chuvas se prolonguem além do necessário.
Não sabe ele que setembro se aproxima e que nós, recifenses, ansiamos pelo retorno do verão com a sua alegria, suas cores, vozes, movimentos?
Não sabe que ele que precisamos do sol, do sal e do azul do céu para elaborarmos a fotossíntese da vida?
Que venha setembro, restaurando a rotina do verão e trazendo o sol de volta!
O povo tropical do Recife agradece!
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* Poeta, jornalista e radialista do Recife/PE

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