terça-feira, 19 de julho de 2011







Ronda da segunda

* Por Talis Andrade

A vida, amiga,
só se tem uma,
vamos gozá-la
descomedidamente.
Não posso permanecer,
vestido no pijama
de madapolão,
deitado em uma tumba
sem inscrição
de anônimo soldado
do ramerrão.
Será que os mortos,
os pobres mortos
das covas rasas
têm inveja
dos que dormem
nos mausoléus de mármore,
os ricos mausoléus ornados
com belos anjinhos?

A culpa, amiga,
é desta vida sedentária
de estúpido escriturário.
O trabalho estólido
para manter o meu duplo:
o sábado.
O sábado que não vem.
O sábado que tarda, talvez bêbado,
parado em uma esquina.
Talvez morto,
esquartejado em um bar.
Ou se amoçando
no neutro espelho
de suntuoso motel.

O luxo embevece
a amante.
O preço arranca
obscenos gozos,
múltiplos gozos.
Proibitivos gozos,
que a mundiça
lá não entra.
Fica do lado de fora
no sereno da noite,
punhetando o frio.



* Jornalista, poeta, professor de Jornalismo e Relações Públicas e bacharel em História. Trabalhou em vários dos grandes jornais do Nordeste, como a sucursal pernambucana do “Diário da Noite”, “Jornal do Comércio” (Recife), “Jornal da Semana” (Recife) e “A República” (Natal). Tem 11 livros publicados, entre os quais o recém-lançado “Cavalos da Miragem” (Editora Livro Rápido).

Um comentário:

  1. Imagem original: humanizar o sábado, feito gente, e depois matá-lo, ou melhor, esquartejá-lo. Bonito e forte.

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