segunda-feira, 25 de abril de 2011







Mãos de fada

* Por Núbia Araújo Nonato do Amaral

Estava quase na hora do seu plantão e enquanto pensava nisso soltou um gritinho baixo, seu namorado havia lhe mordiscado os seios. Com receio de se atrasar mandou-o embora e se recompôs, ajeitando a blusa e os cabelos. Dudu estava indignado, ficou literalmente "de pau na mão". Ela prometeu-lhe uma forra e ele sorriu conformado.
Lavínia cuidava dos idosos da clínica e apesar de não gostar do serviço fazia-o com dedicação. A maioria dos velhinhos eram ativos e espertos, "brincavam" com as enfermeiras menos o senhor da última enfermaria. Apático e sem cor, raramente recebia visitas, definhava a olhos vistos. Cuidava dele com mais atenção, tentando de alguma forma suprir suas carências.
Um dia, enquanto cuidava de seu "vovô", debruçou-se um pouco mais sobre ele para ajeitar as suas cobertas, quando se levantou não conseguiu desvencilhar-se do idoso. Ela tinha certeza de que ele a segurava.
-Vovô me solta!
Nada.
- Vovô, deixa eu terminar meu serviço! Tsc..
- Fala pra sua Lavínia, o que o senhor está querendo? Sou sua amiga...pode dizer!
Tentando a todo custo interpretar a atitude inesperada do ancião, num lampejo de raciocínio malicioso, ela enfiou a mão por debaixo das cobertas e começou a estimular o "vovô". A princípio sentiu um certo desconforto ao sentir "aquilo" mole e inerte, mas com um pouco de insistência logrou sucesso.
Empolgada com o milagre de seu toque caprichou na pegada até sentir a respiração do velhinho ficar mais fraca, quase inaudível. Ela olhou para o seu rosto e notou que suas pálpebras estavam cerradas. Sentiu um calafrio na espinha, limpou as mãos inadvertidamente e tratou de escafeder-se rapidamente, foi quando percebeu que os botões de sua blusa haviam se enroscado na colcha de chenile, por isso não havia conseguido se soltar. Saiu do cenário pé ante pé, certa de que havia matado o idoso.
Quando retornou no plantão seguinte o velhinho da última enfermaria não estava na cama. Lavínia gelou:
- O vovô recebeu alta!? Foi transferido!? Morreu?!?!?!
- Quem? O "vovô abandonado"?
- Sim! Esse mesmo! – respondeu com impaciência.
- Nada menina! Tá todo lampeiro sentadinho na varanda te esperando. Ele disse que você tem mãos de fada!

* Poetisa, contista, cronista e colunista do Literário

4 comentários:

  1. rsss Muito bom, Nubia! O velhino precisva apenas de uma "injeção" de ânimo! Beijos!

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  2. Um fortíssimo conto, uma explosão de vida sobre a condição dos idosos que, para o cuidado... estimulando o "Vovô" que ficou todo metediço com as mãos de fada de Lavínia.
    Parabéns, Núbia.
    Beijos

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  3. Sayonara



    Muito obrigado e um grande beijo
    em cada um.

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  4. Estava hoje falando de um projeto de trabalho com idosos, na área afetiva e filantrópica. Não imaginava sexo alternativo, mas, até estímulos iniciados de forma equivocada(botão/chenille), podem ser salvadores. Quem não precisa de carinho?

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