quarta-feira, 30 de março de 2011



Suor, calor, Brasil, esperança


* Por Keli Vasconcelos


O Sol nasce para todos. O ditado é até manjado, mas falta completar que suar, também, é para muitos. Ouvimos quase sempre o chavão “O dinheiro que ganho vem do suor do meu rosto”, “suor frio”, entre tantos verbetes do sábio palavreado popular.

Aliás, este Brasil deveria ser, além de “a pátria das chuteiras”, o reduto do suor. Suamos para tudo e, mesmo nos momentos mais infames, precisamos deste verbo “suado” para a felicidade nos preencher. Não sei se por influência dos trópicos ou dos tipos. Das tribos ou dos tributos. Das fases ou das famílias.

A essência do suor é o calor humano que, mesmo na animalidade cotidiana, está em voga, explorado e “todo” sorrisos. Mesmo com dilemas, vemos uma oportunidade para soltar as melenas, as feras e entrar na festa. De dizer “bem-vindo” sem ter convite. Declamar “sim”, depois de tantos “nãos” ouvidos.

É fato: quem não acalora tem alma oca, sem vida. No ônibus, no metrô, no trem ou em qualquer meio de transporte devidamente lotado, sente-se o calor humano até nos mais deprimidos. E vamos rumo ao desconhecido, espremidos, gargalhando dos problemas escondidos.

Esta força é encontrada também naqueles que preservam gestos simples: a gentileza, o “obrigado”, o “com licença”, a inocente “desculpa”. Palavras escoam como o suor absorvido pela blusa do esportista. Às vezes evaporam, mas caem como uma tempestade no fim do dia.

Quantas vezes alguém está numa fila e, do nada, fala sobre as mazelas? Quantos momentos o seu ombro não secou as lágrimas do aflito? Sua mão afaga o desespero, procura emprego, sacoleja o brinquedo...

Ora, de duas, uma, se nunca fizera isso outrora: ou não está vivo, ou veio de alguma província que não se chama Brasil. Pode ser um ilustre corrompido no meio de trabalhadores incorruptíveis...

Famintos, ainda temos afabilidade. Melhor quando o calor humano está de barriga cheia.

E, nessa vida transpirada em verdades sufocadas, os brasileiros vêem da janela do ônibus o escaldar da labuta. Um prédio em construção, o tilintar da pá no cimento. O sorriso suado escorrido no rosto do pedreiro que não se cansa.

O calor provocado pela gota suada de esperança.

*Keli Vasconcelos é jornalista de São Paulo. Atuou em rádio, assessoria de imprensa, editora e revistas. Hoje realiza trabalhos como freelancer.

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