domingo, 28 de novembro de 2010




Plenitude – não perfeição

* Por Emanuel Medeiros Vieira

Para Cida, irmã, amiga, comadre, infinitamente amiga

“Um dos motivos mais poderosos que conduzem o homem em direção à arte e à ciência é o de escapar do cotidiano”
(Albert Einstein)

A quarta-feira,
o lado-sombra,
dentro de cada um,
pão, café,
o paraíso pode ser o outro,
não só o inferno?,
o mito é o nada que é tudo,
escreve Pessoa,
um arquétipo universalmente conhecido,
eu sei, é Jung, não Freud,
inconsciente coletivo,
mas de onde vem essa apreensão?,
esse temor metafísico contemplando o mar,
ah, brisa marinha
sempre aspirei a plenitude,
não a perfeição,
sou mortal,
agonia sem nome,
na manhã bela e repetida
a apreensão continua
vontade de chorar ouvindo Cartola e a voz de Elis,
pensando na coleção de amigos mortos,
Ela te contempla ,
a Cachorra, a que te colocará de pés juntos,
novamente citações:
“Deve haver no mais pequeno poema de
Um poeta, qualquer coisa por onde se note que existiu Homero”
(Pessoa — novamente).

Voltarei sempre com as mãos vazias?
Mas estou pleno dessa finitude,
Já sem medo, reconciliado,
olhando as vidas tão “pequenas” e anônimas,
ônibus, salário pequeno, hospital cheio,
a luta de cada dia.

Resta-me a esperança de que um só leitor, um só
–se houver leitores –
daqui a mil anos, entenda o meu esforço
(acolher a linguagem no mundo quebrado).

(Salvador, novembro de 2010)


*Romancista, contista, novelista e poeta catarinense, residente em Brasília, autor de livros como “Olhos azuis – ao sul do efêmero”, “Cerrado desterro”, “Meus mortos caminham comigo nos domingos de verão”, “Metônia” e “O homem que não amava simpósios”, entre outros.

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