sexta-feira, 28 de maio de 2010




Politicamente correto

Por Rodrigo Ramazzini

Pai e filho, em uma parada de ônibus.
- Estou com fome, pai!
- Calma! O ônibus já deve vir vindo... Em casa tu comes algo...
- Mas podia comprar um cachorro quente para mim agora, né?
- Onde tem?
- Ali ó!
- A barraca daquele negão vende lanche?
- Ooooh Pai!
- O que foi?
- Não se pode chamar ninguém de negão, pai! A professora da escola ensinou...
- Tua professora não sabe nada! Ela quer tampar o sol com a peneira...
- Que sol? Que peneira?
- Pára de fazer pergunta...
- E o meu cachorro quente?
- Depois tu comes... Só pensa em comer, guri! Daqui uns dias tu vais estar uma bola, gordão que nem aquela cara lá do outro lado da rua... Vão te chamar de baleia na escola...
- Ooooh Pai! De novo...
- O quê?
- Não se pode chamar ninguém de gordo ou colocar apelido em quem na verdade é obeso e pode ter até uma doença...
- Ah tá! Quem falou essa bobagem?
- A professora...
- Essa tua professora é uma hipócrita!
- O que é hipócrita, pai?
- Pergunta para a tua professora, ela sabe tudo...
- Sabe mesmo...
- Eu vou te contar... Quanto mais eu rezo, mais assombração me aparece...
- Por que está dizendo isso, pai?
- Nada! Nada É que o mundo está ficando quadrado, filho! Só isso...
- Como quadrado?
- Sem senso de humor, tudo certinho... Enche o saco!
- Não entendi?
- Deixa pra lá! O que besteira mais ela falou?
- Que...
- Que machorra... Que Sapatão é lésbica... E... E... Veado se diz homossexual, isso?
- Exatamente!
- Eu sabia...
- Se sabia por que não falou certo?
- Dá para ficar quieto agora?
- Está bem... Bah!Olha lá do outro lado da rua, pai!
- O quê?
- Meu colega...
- Que colega?
- O vesguinho... OOOOOHH, VESGUINHO, E AÍ? BELEZA?
- Filho! Isso é jeito de chamar o guri?

* Jornalista

3 comentários:

  1. É engraçado isso.
    Quando os rótulos se tornam ofensivos e politicamente incorretos.
    Tapamos o sol com a peneira enquanto a sujeira
    rola a solto por debaixo dos panos.
    Ah, mas é daí? Ninguém tá vendo...
    Pregar o discurso e não praticar tá certo?
    E a hipocrisia se espalha...
    Ótimo texto Rodrigo.
    Abração

    ResponderExcluir
  2. Concordo que muito da graça ficou sem graça, pois estão todos engessados. Mesmo assim ainda prefiro o aparente pensamento único do que as grosserias. Enquanto o lado de lá ri, o lado de cá chora. Não tem graça nenhuma ser vítima de preconceito. Bom texto para refletir, e no final ficou engraçado, pois em algum momento o pensamento sai alto, e podemos ser traidos pelo que nos foi ensinado antes.

    ResponderExcluir
  3. Quero saber como fica o poema "Irene" de Manuel Bandeira, "Essa Nega Fulô" de Jorge de Lima e tantos outros poemas. Como será que cadeirantes, bengalantes, etc. vêem isso? Gostaria de saber.

    ResponderExcluir